O barco conduz-nos pelo mangueiral até às grutas da Caveira, a Tham Phi Hua To, onde podem ver-se pinturas rupestres pré-históricas. Apesar das nossas tentativas para distinguir para além da espessa paleta de verdes que se nos apresenta, tal é impossível. Aqui, no parque Than Bok Khorani, a opção é navegar através dos canais que servem de estrada até ao mar a poucos quilómetros de distância, passar Tham Lot – uma espécie de túnel sob uma montanha de calcário – e chegar à gruta onde estranhos desenhos de encarnado e negro forte se espalham por um sistema de cavernas recheado de estalagmites e estalactites. Pan, o nosso guia, vai justificando, com a proximidade desse mar e a abundância de caça e pesca a existência neste refúgio natural de um povo antigo que fixava o seu quotidiano através destas pinturas, mas não consegue precisar-nos a data dos desenhos.
E eis que, de súbito, Pan nos alerta, no seu inglês de autodidata, que nos apressemos porque uma tempestade se aproxima. Apesar de aos nossos olhos o tempo parecer sereno, não arriscamos e precipitamo-nos para o pequeno barco – inconvenientes da época das chuvas. À medida que chegamos ao local de partida, um cais em palafita ligado por barcaças, conseguimos sentir a chuva forte. Molha, mas não refresca, porque o calor, esse, não dá tréguas. Aliás, os tailandeses costumam dizer que têm três estações: calor, calor e chuva e muito calor. Não é que a temperatura seja muito elevada, mas o excesso de humidade vai deixando marcas nos nossos hábitos de tempo ameno. E acabamos por receber a monção de braços abertos.
Pan acelera o seu pequeno barco, ultrapassando os desventurados que fazem a mesma visita, mas de caiaque. Ali ao lado do canal espera-nos a boa e caseira cozinha thai, mas tem de ficar para mais tarde. Agora é tempo de seguirmos para outro parque: o Tha Pom Klong Song Nam.
Ciceroneados pelo guia Man, partimos à descoberta de parques luxuriantes como Tha Pom Klong Song Nam ou Nong Lay, onde é possível andar no dorso de elefantes ou fazer a observação de borboletas.
Sawasdee
O Man (é mesmo o nome dele) bem se esforça, mas é quase impossível perceber o seu inglês. O nosso tailandês também não é brilhante, mas o truque para despertar a máxima hospitalidade dos nossos anfitriões é aprender a fazer bem a audação. Devemos juntar as mãos (quase como se estivéssemos em oração) e proferir Sawasdee: no caso de ser pronunciado por um homem deve acabar em Kap e por uma mulher em Kaa. A princípio parece difícil, mas quando se escuta bem os locais percebe-se perfeitamente a subtileza e o nosso Man apreciou o esforço. Vai-nos guiando por um passadiço e mostrando o local protegido pela flora local. Assemelha-se a um santuário em torno do lugar onde a força da água doce se junta ao oceano, dando origem a uma espécie de lago de água extraordinariamente translúcida e cheia de peixes coloridos.
O nosso cicerone vai explicando o que vemos à volta das diferentes árvores da borracha – caranguejos, térmitas e insetos coloridos – afortunadamente zelando para que não tenhamos nenhum encontro mais imediato com aranhas ou cobras menos simpáticas. Os nomes dos frutos e flores que se nos apresentam são traduzidos literalmente, desconhecida que é, por Man, a sua designação em inglês: limão do mar, jasmim do mar, figo da floresta e por aí adiante. Tudo aqui é ligeiramente alterado para se adequar à unicidade deste sítio.
Bond, um barco James Bond
No fim do parque Tha Pom Klong Song Nam, fica um ancoradouro para os barcos de pesca que trabalham na faina ao longo da costa dos diversos arquipélagos em redor de Krabi e Trang.
Claro que o dinheiro e o tempo de que dispomos influenciará a escolha, mas neste país andar de barco é tão natural como apanhar um transporte público. Uma das opções que, seguramente, lhe proporão é um James Bond boat. Os barcos foram assim batizados desde que Roger Moore conduziu um no filme de 1974, O Homem da Pistola Dourada. Mais lentos do que os seus parentes modernos, mas consideravelmente mais baratos, fazem parte da paisagem das costas e dos arquipélagos da zona e são uma alternativa para quem quer visitar as ilhas sem abdicar do conforto.
Entre os muitos filmes rodados na Tailândia, um dos mais marcantes até hoje foi O Homem da Pistola Dourada, do mais famoso espião britânico de sempre, pelo que o tipo de barco conduzido numa cena por Roger Moore ficou conhecido como James Bond boat.
Pode escolher entre ir em grupo ou gastar um pouco mais e reservar um barco para um tour à sua medida. Não deve contudo deixar de visitar, ao largo de Krabi, as ilhas Hong. Paraíso inabitado de areia branca, a Hong possui uma baía natural que permite mergulhar com pé junto dos peixes; a Mu Ko Hong, por sua vez, obriga a entrar de barco por entre um pequeno desfiladeiro até uma lagoa de cor verde e vegetação impressionante.
A segunda opção fica a trinta minutos deste pequeno arquipélago e ganha o nome da sua ilha maior: Poda. Esta é ponto de abastecimento para as embarcações que por aqui passam, com os seus dois restaurantes e um ilhéu vizinho a lembrar um filme do espião ao serviço de Sua Majestade. Numerosos turistas aproveitam para mergulhar e fazer uma pausa entre visitas às ilhas. Curiosamente, não se veem aqui muitas tailandesas.
A explicação é dada pela nossa guia: as mulheres locais não gostam de apanhar sol para não correrem o risco de ficar muito morenas. Aliás, é comum ver nas ruas de Krabi um esforço de maquilhagem para tornarem o tom de pele mais claro. Definitivamente mudam-se as latitudes, mudam-se as vontades.
Muitos forasteiros admiram-se com a ausência quase total de mulheres tailandesas nas praias destas ilhas. Tal não se deve a um excesso de pudor, mas a uma razão bem mais prosaica: uma pele muito morena não é para elas um paradigma de beleza.
Nas ilhas vizinhas esperamos pela maré baixa que permite andar a pé entre a maior Koh Kai (literalmente, ilha da Galinha), Koh Tab e Koh Moh. Durante algum tempo, é possível percorrer pequenas faixas de areia que ficam a descoberto na vazante e tornam a passagem possível. Não somos os únicos a fazê-lo; alguns macacos e répteis optam por ir variando de habitat consoante a maré.
Nuat phaen boran, claro
Abundam por toda a Tailândia diversas ofertas de massagens: da mais simples, para alívio das dores de quem calcorreia estas paragens a pé, à completa thai, um exercício de força que relembra alguns músculos já esquecidos e inclui o recurso a tanques repletos de peixes. O difícil é escolher entre tantas opções que podem ser experimentadas em pequenas lojas de rua, escolas de massagem ou nos hotéis que amiúde oferecem pacotes especiais de estada e massagem.
Destaca-se, neste capítulo, o Waree Raksa. A 45 quilómetros de Krabi, está aberto ao público há cinco anos, mas funciona há muitos mais como centro de formação de um grupo hoteleiro. Propõe uma mistura entre tratamentos que combinam comida saudável, água termal e obviamente as massagens aplicadas em pequenos pagodes na selva – verdadeiramente único. Su Jin é professora e massagista há mais de 15 anos e descende de uma família que sempre usou no seu dia a dia a Nuat phaen boran como forma de manter o bem-estar físico, mas também psicológico. Vai explicando que o fim é usufruir de todas as vertentes dos tratamentos tradicionais tailandeses, o que pode passar também pela imersão em águas termais naturais, a ingestão de um chá de gengibre e cardamomo ou de frutos como o durian (de cheiro intenso) ou o doce mangosteen.
Doce herança
Para sul, ao longo da costa da Andaman, a cidade de Trang começa a ser um destino difícil de evitar para quem visita o Sudeste Asiático. Com aeroporto próprio e voos regulares de e para Banquecoque, a cidade de aproximadamente sessenta mil habitantes retrata bem a região que junta em harmonia uma forte comunidade chinesa dedicada ao comércio, malaios essencialmente pescadores e tailandeses que retiram o sustento da extração de borracha. Curiosamente, as diferenças resultam numa combinação única que se reflete na gastronomia e tem na zona dos mercados o retrato perfeito.
Aqui tanto consegue encontrar fruta exótica como marisco em tons azulados, carne halal, banana frita, dim sung ou kanom foy tong, nada mais nada menos que fios de ovos. Os tailandeses herdaram esta iguaria dos portugueses, que a introduziram na antiga capital do país, a norte de Banguecoque, em meados do século X, contribuindo assim para a maravilhosa miscelânea que é a comida local. Mas, sendo este um povo piscatório e com uma costa abundante em peixe, também é possível matar saudades de casa provando uma das muitas conservas de peixe, da qual se destaca a marca Pompuy (literalmente, roliço).
Na cidade, entre as lojas, pode encontrar lugares onde se praticam as tradicionais massagens tailandesas: com menos glamour do que as dos hotéis de cinco estrelas, mas muito mais autênticas.
O trânsito intenso justifica que o meio de transporte nacional seja… a moto. Parece que toda a gente tem uma e o seu uso, apesar de frequentemente desafiar algumas regras no que respeita a lotação, é feito com bastante civismo. Outra escolha óbvia para se deslocar são os táxis. Com obrigatoriedade de combinar à partida o preço, existem em duas versões: tuk-tuk, uma espécie de motocarro comunitário, ou a versão simplesmente moto, que tanto pode ser uma experiência simpática como um pesadelo, dependendo do condutor. Se tiver oportunidade, deve visitar o templo chinês, paredes meias com o templo budista: em ambos está garantida uma receção calorosa, desde que tenha o cuidado de não entrar em nenhum deles calçado e não esqueça a saudação… no seu melhor tailandês!
Felicidade aquática
Apesar de a capital de província de Trang ser perto da costa, se aprecia praia não deve deixar de visitar a aldeia piscatória de Si Kao. Com uma baía maravilhosa a convidar para um mergulho no mar de Andaman, a zona é conhecida por ser dada ao romance. Ou não ocorressem aqui inúmeros casamentos, tanto em terra como debaixo de água, por ocasião do festival anual que em fevereiro terá a sua décima sétima edição. Começou timidamente a distribuir felicidade subaquática no Dia de São Valentim de 1996 e é atualmente detentor do recorde Guinness da «modalidade», aceitando inclusive casais do mesmo sexo.
Se prefere outras emoções fortes e não tem claustrofobia, a gruta esmeralda, na ilha de Ko Mook, é para si. Antigo local de refúgio para piratas e contrabandistas, exige que se nade perto de 85 metros por um túnel em completa escuridão para chegar a uma praia interior dominada por um verde impressionante.
Outra escolha para os mais aventureiros reside em visitar a gruta Tham Lay Khao Kobe, no continente. O trajeto é feito por cursos de água que atravessam a selva até entrarmos num labirinto de túneis de pedra calcária. Pequenos ancoradouros subterrâneos permitem abandonar o barquinho e visitar diversas cavernas pejadas de estalactites e estalagmites. A verdadeira prova de esforço, no entanto, é a saída, que inclui um percurso de dez minutos deitado no chão do barco, em completa escuridão, tão pequena é a distância em relação ao teto da cavidade. Pode ser desgastante, mas com o estado de espírito certo também pode ser divertido.
Para repor energias, há uma série de restaurantes locais com uma seleção de comida tradicional, sempre pontuada pelo uso do picante, ingredientes muito frescos e um cheiro muito perfumado. É normal ver os locais a mordiscar um pouco de tudo o que está na mesa, por isso não estranhe se lhe servirem ao mesmo tempo uma sopa tom kha kai com coco e frango, um arroz de jasmim ou castanho ou então um caril verde, além de uma seleção de fruta que inclui invariavelmente melancia e ananás. Não foi diferente no restaurante Riverside Trang. Situado numa barcaça fundeada à entrada da cidade, o cenário não podia ser mais de filme. Enquanto degustamos um caril de caranguejo servido em coco e um phat thai – a massa frita que é quase um ícone nacional –, é impossível não relaxar e desfrutar da sombra e da calma da paisagem. Na rádio, Gloria Gaynour canta Never Can Say Goodbye. E, de facto, não apetece mesmo nada dizer adeus.
Agradecimentos
Turkish Airlines
Hotel Anantara Sikao
Sofitel Krabi Phokeethra
Golf & Spa Resort
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