Apreciador que é de um bom churrasco, João Pedro Oliveira não conseguia encontrar a cerveja ideal para acompanhar as costeletas e as outras carnes grelhadas de que tanto gosta. Há cinco anos, quando provou a sua primeira cerveja artesanal, uma american IPA, existiam ainda poucas marcas portuguesas. E nenhuma lhe dava o amargo «choque de lúpulo na boca» que queria. Por isso, decidiu elaborar a sua própria receita. O que começou por ser uma brincadeira é agora coisa séria. João Oliveira deixou o seu trabalho como operador de call center e vive agora da cerveja que fabrica, a Colossus, lançada em finais de setembro. O processo foi longo e com alguns reveses. Autodidata, brinca, definindo a sua cerveja como «dolorosamente artesanal». Na pequena fábrica instalada no centro da cidade faz tudo, desde a moagem do cereal à rotulagem das garrafas, esta última tarefa com a ajuda da namorada.

A «brincadeira» começou com um simples kit de cerveja. «As primeiras experiências deram para perceber que não era um bicho-de-sete-cabeças», diz. Mas foi enquanto recuperava de um acidente de viação, que o deixou incapacitado durante seis meses, que aprofundou conhecimentos. «Aproveitei para ler livros e ver documentários sobre o tema.»

João Oliveira trocou o trabalho num call center para se dedicar a tempo inteiro à cerveja artesanal.

A sua primeira cerveja, a tal para acompanhar grelhados, que chamou de Wonderlust, nasceu na cozinha, com material rudimentar, e era servida aos amigos. A oportunidade de levar a coisa a sério surgiu quando um colega o incentivou a participar no Poliempreeende, concurso de ideias do Instituto Politécnico do Porto. «Não tinha intenção de fazer disto negócio. Mas eles perceberam que o produto era bom e que eu tinha paixão pelo que fazia.» Ultrapassadas as burocracias, percebeu que era viável e fez «uma cerveja a correr para apresentar ao júri do concurso». No fim da manhã, os jurados, já com o apetite aberto, provaram a cerveja, acompanhada de salmão fumado e presunto. «Adoraram! Acabei por ficar em segundo lugar, o que foi uma vitória.»

A Wonderlust é uma imperial IPA de aroma leve e frutado. A gama Colossus inclui também uma witbier de aroma fumado chamada Adamanteia.

Com o dinheiro do prémio comprou panelas maiores e criou outra cerveja para acompanhar saladas, peixe e marisco, a Adamanteia. Com dois «sabores» na manga, correu os bares da Baixa e teve receções «calorosas». Em janeiro deixou o call center e conseguiu, novamente a custo, captar investimento para abrir empresa e montar o laboratório. «Foi complicado. Estava habituado a fazer tudo num sistema muito mais pequeno. No primeiro dia, cheio de entusiasmo, produzi uma panela que acabou por ir para o lixo. Depois, refiz as contas e começou a sair bem», conta. Neste longo processo, João desanimou muitas vezes, mas agora está tudo a «encarreirar» e as suas Colossus já podem beber-se em vários bares do Porto.


No copo

Wonderlust
Do alemão «wanderlust»: wandern (caminhar) e lust (desejo). Desejo de explorar o mundo, de seguir em direção ao desconhecido. É uma imperial IPA de aroma leve e frutado, revelando o amargor no primeiro trago. Após alguns momentos são reveladas as notas florais e frutadas, mas é o amargo do lúpulo que fica no palato. Acompanha pratos de carne, grelhados e francesinha.
Sugestão do cervejeiro: beber num fim de tarde de outono com um bom bife de lombo grelhado e ao som de Led Zeppelin.

Adamanteia
Na mitologia grega, a Adamanteia é uma das Melíades, ninfa guerreira filha de Urano, nascida de um carvalho. Criou e protegeu Zeus do seu pai Cronos, após este saber que um dos filhos iria roubar-lhe o lugar no Panteão. É uma witbier de aroma fumado obtido através da utilização de malte de trigo fumado em carvalho. O aroma é doce e ligeiramente cítrico, sobressaindo a laranja e o gengibre. Harmoniza com peixe e marisco, saladas e massas. Sugestão do cervejeiro: beber fresca, numa tarde quente, acompanhada por uma salada de salmão e ao som de Beatles.

 

Texto de Luísa Marinho - Fotografias de Leonel de Castro/Global Imagens
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