Zagreb é a casa de mais de um milhão de pessoas. Tem mais de 900 anos de história e é o ponto nevrálgico da economia croata.
De monumentos a museus, de restaurantes a mercados, passando por zonas de comércio e de lazer, a cidade tem muito para oferecer sem ser óbvia.

 

O sorriso despachado de Kosjenka – que diz, num português divertido, aprendido pela internet, que podemos chamar-lhe Maria porque até para os conterrâneos o seu nome, vindo de um conto tradicional croata de que a mãe gostava muito, é peculiar – apagou a má impressão que a noite anterior, a da chegada à capital da Croácia, tinha deixado dos zagrebinos.

Nessa noite, que era de sexta-feira, tinha sido missão quase impossível encontrar, no centro de Zagreb, um restaurante que servisse jantar às dez da noite. Impossível mesmo foi encontrar quem o fizesse com simpatia, e diante da nossa estranheza, um empregado de mesa mal-encarado explicou, num inglês arrevezado: «Estamos nos Balcãs.» O que, verdade seja dita, não explica nada, uma vez que era já o quinto dia na Croácia, com passagem por Opatija, Nin, Zadar, Trogir e Split, e foi a primeira vez que demos de caras com más energias. A digestão exigia um café, mas isso, depois das onze, só no multinacional McDonald’s.

A manhã, ajudada pela guia Kosjenka Firak, ou Maria, trouxe nova luz sobre Zagreb, mais de 900 anos de história, outrora dividida em duas colinas – a secular Gradec e a religiosa Kaptol, hoje, parte alta e parte baixa da cidade respetivamente – cuja fronteira era delimitada por um riacho que deu lugar a uma das ruas mais carismáticas da capital croata, a Tkalciceva. Mas lá chegaremos, para almoçar.

Antes, há que passar pela imponente catedral, seguir para o colorido mercado Dolac, onde frutas e flores pontuam entre as mais variadas mercadorias, passar por um beco chamado Krvavi, cuja tradução é qualquer coisa como Ponte Sangrenta, ligação entre as antigas Gradec e Kaptol e palco de lutas mais ou menos violentas entre as gentes de uma e outra colinas, para subir a íngreme Radićeva, que leva à única antiga porta preservada de acesso à antiga Gradec, a Porta de Pedra (Kamenita vrata), onde debaixo do arco uma representação da Virgem Maria, milagrosamente salva de um incêndio em 1731, é lugar de peregrinação e pedidos à ajuda divina.

Passado o portão, a mais antiga farmácia da cidade, em funcionamento contínuo desde 1355 e onde se diz ter trabalhado um bisneto de Dante Alighieri, e depois a Praça de São Marcos, onde uma igreja dedicada ao mesmo santo ostenta nos telhados os brasões do reino da Croácia, Dalmácia e Slavonia e da cidade de Zagreb.

Tudo a correr porque é quase meio-dia e a essa hora a Torre Lotrscak (13), ali perto, reserva uma surpresa aos incautos turistas. Um tiro de canhão impróprio para cardíacos faz-se ouvir todos os dias àquela hora. Passado o susto, e antes de entrar no moderno Museum of Broken Relationships, há que apreciar a vista que lá do alto se tem sobre a cidade baixa. A uns metros, o Strossmayer Promenade, um passeio que prometia, fica por fazer. Há um museu único no mundo por visitar.

Na cidade dos corações – um dos símbolos de Zagreb é um coração decorado, com um espelho no meio, para que quem o recebe veja o reflexo da pessoa amada por quem o deu –, abriu há seis anos um museu dedicado aos corações partidos. Lá dentro, histórias de relações que correram mal ilustradas por um objeto que as simboliza. Há quem chore, há quem se ria, mas não há quem resista a lá entrar.

Descemos finalmente à Tkalciceva, onde há tempo para beber uma cerveja croata, que ainda não é hora do almoço no restaurante Agava, um dos melhores da cidade, flanar pelas (muitas) lojas de recordações e encontrar a estátua de uma mulher – Marija Jurić Zagorka (1873-1957) (10) –, a primeira jornalista croata e lutadora pela igualdade de direitos.

A tarde livre e já sem guia levou-me sozinha a dar uma terceira oportunidade a Zagreb. A pé, da praça Ban Jelačić, centro da capital croata, até à estação de comboios (12), que chegou a ser paragem do Expresso do Oriente, e a liga às principais cidades croatas e europeias, passando pelo parque Zrinjevac (11), onde decorria um evento cultural que juntava música, artes e muita gente, e onde uma «coluna meteorológica» com mais de 100 anos prende a atenção e permite verificar a hora, a temperatura do ar, a pressão atmosférica e os níveis de humidade, e deambulando pelas ruas sem destino até o céu se acizentar e a chuva começar a cair, deu para sentir a cidade. E ter vontade de lá voltar. Com tempo.

 

 

Catarina Pires, jornalista
Editora da revista Notícias Magazine, viajou até à Croácia com a Volta ao Mundo. Entre Split, Zadar, Opatija, Trogir e Zagreb, por onde andou, escolheu começar pela capital, pelo desafio que foi decidir conhecê-la apesar de uma primeira má impressão. Neste mês escreve sobre Zagreb, mas promete voltar à Croácia noutras edições.

 

Agradecimentos

A Volta ao Mundo viajou a convite da Croatia Airlines e do Turismo da Croácia.


Texto de Catarina Pires - Fotografias Direitos Reservados
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