O mundo podia ter nascido aqui

O lugar que é preciso conhecer antes de morrer. Há quem diga que Machu Picchu é isso. Talvez. Ou talvez seja o lugar que é preciso conhecer antes de continuar a viver. Mas ainda não chegámos lá. Há um comboio da Perurail para apanhar. Não o premiado e aclamado Belmond Hiram Bingham, com serviço de luxo e nome do professor norte-americano que «redescobriu» a cidade perdida dos incas em 1911, mas também não é o low cost Expedition.

Embarcamos no Vistadome para cerca de três horas de viagem que fazem justiça ao nome do comboio e nos fazem perceber a adoração dos incas, e dos atuais peruanos, à Pacha Mama, a mãe terra ou mãe natureza. O pequeno-almoço a bordo – pastel de acelga, três panquecas com doce de frutos vermelhos, banana peruana, morangos e mate de coca – e a simpatia dos «hospedeiros» são a única coisa capaz de nos distrair da paisagem. A certa altura, nas montanhas, vislumbra-se um grupo de caminheiros. Willy explica.

Outra das formas de chegar a Machu Picchu é a pé, percorrendo o caminho inca e acampando pelo caminho. Inveja.

Há várias formas de chegar a Machu Picchu. Os comboios da Perurail são uma das mais confortáveis.

Última paragem: Águas Calientes, também conhecida por Machu Picchu Pueblo, pequena cidade atravessada pelo rio Urubamba, a mais próxima do mítico destino peruano, ao qual se deve a sua existência. Hotéis, restaurantes, fontes termais, um enorme mercado de artesanato cusquenho e a paragem dos autocarros que levam lá acima por estradas íngremes e estreitas sobre escarpas, em trinta minutos de pânico, sobretudo para quem vai à janela. Mais uma vez a importância de respirar. Fundo, neste caso, para espantar o medo.

Chegamos tarde a Machu Picchu, a velha montanha. É hora de almoço. O ideal seria vir de manhãzinha. Menos gente e outra luz. Ainda assim, não temos que nos queixar. Chegámos aqui antes de morrer. Mais uma subida, agora a pé. Escadas e mais escadas. E depois, uau. Não se consegue explicar muito bem. Uau, que nem uma palavra é, é a única que ocorre. O fotógrafo está aqui em vantagem. As imagens são mais eloquentes do que as palavras.

Willy, no entanto, continua a falar e a guiar-nos por este lugar a 2400 metros de altitude, no vale do rio Urubamba, cuja beleza natural é de cortar a respiração, tanto como a obra humana, último reduto do império inca, apenas acessível às suas elites políticas, religiosas e intelectuais, e ao qual os colonizadores espanhóis nunca lograram chegar. Ouvimo-lo ao longe.

Património da Humanidade desde 1983 e Maravilha do Mundo desde 2007, Machu Picchu é a principal atração turística do Peru.

Depois podemos ir à internet e ficar a saber que a cidade perdida dos incas misteriosamente terá sido habitada apenas durante cerca de noventa anos, entre o século XV, data da sua fundação por Pachakuteq, e o século XVI e que em 1911 foi devolvida ao mundo pelo norte-americano Hiram Bingham e que em 1983 foi classificada pela UNESCO Património Cultural e Natural da Humanidade e que em 2007 foi considerada uma das maravilhas do mundo moderno e até que significado espiritual e filosófico tem cada um dos locais a que Willy nos leva: a porta principal, o templo do Sol, a pedra cerimonial, o setor dos templos, o templo das três janelas, a casa do inca, o templo do condor, o observatório astronómico… E, por isso, seguimo-lo, escapando. Para olhar e sentir. Não por misticismo. Apenas porque é arrebatador.

Huayna Picchu, a jovem montanha, em frente, que com a adjacente parece formar um rosto, também pode ser visitada. E, diz-se, nós não fomos lá, ver Machu Picchu do alto de Huayana Picchu é outra coisa que há a fazer antes de morrer. Tão cedo não podemos partir, portanto. Entretanto, a chuva e a tarde começam a cair e ainda não é desta que dançamos. Talvez na selva.

Texto de Catarina Pires – Fotografias de Leonardo Negrão/Global Imagens
(Reportagem publicada na revista Volta ao Mundo de março de 2015, adaptada ao site)

Natureza e aventura no Peru (Episódio 1 – RTP3)


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Texto de Catarina Pires - Fotografias de Leonardo Negrão/Global Imagens
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