Algo de muito bom se passa no reino da Dinamarca. Siga as nossas quatro dezenas de sugestões para uma viagem por Copenhaga, provavelmente a cidade mais cool do mundo.

Texto e fotografias de José Sérgio

Sempre houve muitas boas razões para visitar Copenhaga, mas talvez nunca tantas como agora. Nos últimos anos, a capital da Dinamarca estendeu a sua zona de influência bem para lá das fronteiras do design e transformou-se numa das cidades mais cool da Europa (e provavelmente, para citar um famoso anúncio de uma famosa cerveja dinamarquesa, também numa das mais cool do mundo).

A revolução gastronómica impulsionada por chefs como René Redzepi num dos laboratórios onde nasceu «a nova cozinha nórdica» – o Noma, várias vezes eleito o melhor restaurante do mundo, e que aguarda agora de portas fechadas o fim das obras de adaptação das suas novas instalações – foi só um dos muitos acontecimentos a pôr Copenhaga no mapa, juntamente com uma visão da cidade assumidamente amiga dos residentes, dos turistas e do ambiente, uma qualidade de vida muito acima da média (que faz inveja) e a contagiante simpatia dos seus habitantes.

Por razões óbvias, o verão é a altura do ano em que Copenhaga atinge o seu máximo esplendor, aquela em que é possível tirar total partido das esplanadas, dos parques e das intermináveis ciclovias. Já era assim sem o novo festival multidisciplinar com curadoria de dois músicos dos The National (os irmãos Aaron e Bryce Dressner), do chef Claus Meyer e da microcervejeira Mikkeller cuja primeira edição teve lugar a 11 e 12 de agosto. Mas a chegada do Haven (havenkbh.dk) e do seu gangue de gente cool faz deste – provavelmente, mais uma vez – o melhor mês de sempre para uma visita à cidade.

Dia 1

Não há maneira mais certa – nem mais cénica – de circular por Copenhaga do que com as mãos no volante e os pés nos pedais de uma bicicleta. As faixas cicláveis cobrem toda a cidade (e mais além) e há bicicletas para todos os preços e gostos. Algumas, como as famosas Bycyklen disponibilizadas pelo município, são elétricas e estão equipadas com GPS. Para entrar imediatamente no espírito, o ideal é alugar uma bicicleta reciclada. No pátio da Urban House (Colbjørnsensgade, 11), um dos maiores hostels de Copenhaga, a Recycles tem largas dezenas delas por preços bastante razoáveis.

Agora que tem a bicicleta certa, pode pedalar em direção à Israels Plads, praça onde todos os sábados, das 08h00 às 14h00, os habitantes de Copenhaga compram e vendem (obrigatório regatear) mobiliário vintage, brinquedos dos anos 1970 e 1980, vinis usados, utensílios de cozinha, ferramentas agrícolas do tempo dos avós, porcelanas raras da Royal Copenhagen (o equivalente à nossa Vista Alegre) ou vistosas edições ilustradas dos contos de Andersen. Num país em que a cultura da reutilização está profundamente enraizada, as feiras da ladra são um ritual fundamental da temporada primavera-verão. Além de ser a mais antiga da cidade, esta tem outra vantagem: quando a fome aperta, basta atravessar a rua.

Os melhores queijos da Dinamarca? As ervas nórdicas mais frescas? O salmão e o arenque mais bem fumados? As cervejas artesanais mais imprevisíveis? Tudo isso, no mercado Torvehallerne (Frederiksborggade, 21) que cruza as bancas de frescos com lojas especializadas em charcutaria italiana, café colombiano ou azeitonas gregas e restaurantes onde se pode comer o mundo inteiro ao balcão (das tapas ao sushi, passando pelas clássicas sanduíches abertas dinamarquesas de nome quase impronunciável: smørrebrød). Coma dentro, enquanto observa como os locais se abastecem no seu dia-a-dia, ou então encha o cesto da bicicleta com os queijos da Unika by Arla e as cervejas da Mikkeler (que também dão ótimos souvenirs) e, já que é verão e o dia nunca mais acaba, vá piquenicar.

Para perceber por que é que o design e a Dinamarca são sinónimos, nada como uma visita ao Designmuseum Danmark (Bredgade, 68). As alas deste edifício que começou a sua vida como um hospital do século xviii albergam toda a história do design dinamarquês. O percurso dedica capítulos inteiros a ícones como as cadeiras de Arne Jacobsen ou os candeeiros de Kaare Klint, que todos já vimos nalgum lado, mas também revela segredos bem guardados do design têxtil ou do design gráfico made in Denmark e ainda antecipa o futuro, através de uma fascinante série de protótipos.

Não muito longe das multidões que diariamente invadem a estátua da Pequena Sereia, é possível encontrar o sossego absoluto – e algumas das melhores vistas sobre Copenhaga. Embora mantenha a sua vocação militar, a cidadela de Kastellet (Gl. Hovedvagt), fundada em 1626, é sobretudo um enorme espaço verde cuidadosamente preservado entre muralhas (um pentagrama perfeito, para quem as vê de cima). Ideal para um passeio (ou para uma sesta) ao final da tarde.

Numa vertente mais trendy temos aquilo que em tempos foi matadouro e principal mercado abastecedor de carne da cidade, funções que em parte conserva. O Kødbyen (Flæsketorvet) reconverteu-se numa das mais descontraídas e concorridas zonas de restauração e lazer de Copenhaga. Restaurantes como o temático Fleisch, especializado em carne (onde os casacos ainda se penduram em ganchos de talho) ou o indiano Bollyfood, mas também bares, galerias, startups, ateliês de artistas e estúdios de design dão uma vida paralela a este complexo, tanto de dia como de noite, enquanto a dois ou três quarteirões de distância a vocação red light district do bairro continua a resistir estoicamente à mudança (e a atrair a indústria das despedidas de solteiro). No verão, o mercado de comida de rua que ali decorre todos os sábados e domingos é um bónus.

Dia 2

Aberto desde 2004 neste endereço (entretanto já há mais duas sucursais na cidade e outra em Reiquejavique, na Islândia), o Laundromat Cafe (Elmegade, 15) é ao mesmo tempo uma lavandaria, uma biblioteca bastante bem recheada (onde os livros estão organizados por cores) e um café para todas as ocasiões. Ao pequeno almoço há panquecas de mirtilo e ovos Benedict, ao almoço servem-se hambúrgueres e saladas, não faltam bolos à fatia para o lanche e quem ficar até à noite tem uma lista de quarenta cervejas por onde escolher (ao fim de semana, há um brunch afamado). A esplanada tem vista privilegiada sobre um dos bairros mais hipsters da cidade, Nørrebro, mas só estando lá dentro é que se pode comer ao som das máquinas de lavar.

Mais do que um cemitério cheio de mortos que contam histórias, o Asistens Kirkegård (Kapelvej, 4) é um parque denso e cheio de vida. Aos fins de semana, os seus relvados enchem-se de gente a tomar banhos de sol ou a fazer jogging, de famílias com crianças e cestos de piquenique, de visitantes que aparecem com flores para cuidar dos seus ou simplesmente de curiosos de passagem, talvez necessitados de algum conselho – o escritor Hans Christian Andersen, o físico Nils Bohr e o filósofo Søren Kierkegaard foram lá sepultados…

Ao fim de semana, o cemitério onde Hans Christian Andersen está sepultado enche-se de gente a tomar banhos de sol e famílias com cestos de piquenique.

Se há rua que pôs o bairro de Nørrebro no mapa dos destinos mais cool de Copenhaga, essa rua é a Jaegersborggade. Cafés com esplanada, gelatarias, floristas, lojas de design e de ilustração, tudo tem um aspecto delicioso por estas bandas. É também o caso do menu do Manfreds og Vin (Jaegersborggade, 40), um pequeno restaurante fornecido por unidades dinamarquesas especializadas em ingredientes biológicos. O foco está nos vegetais, mas o bife tártaro é imperdível.

Há várias maneiras de ver Copenhaga de cima (incluindo os vertiginosos carrosséis dos Jardins Tivoli, e lá iremos), mas uma das melhores passa por subir até ao topo da torre da Câmara Municipal, a 105 metros de altura (Rådhuspladsen). Não só porque é uma das mais altas da cidade, mas porque depois da visita (são sempre duas por dia, de segunda a sexta) há liberdade total para circular pelo edifício e ver os bastidores da cidade em pleno funcionamento. E não terá de ter muita sorte para assistir a um ou a vários casamentos.

Autêntica caixa-forte da história da Dinamarca, o Nationalmuseet (Ny Vestergade, 10) é o lugar para perceber de onde vem e para onde vai este país, com valiosos tesouros patrimoniais que recuam até à Idade da Pedra e, claro, à mítica época viking, mas que também dão conta dos terríveis incêndios que devastaram a cidade, da dureza da vida quotidiana sob a ocupação nazi, da explosão do design dinamarquês ou da revolução sexual dos anos 1970.

Ainda no campo das artes, e popularmente conhecida como «o diamante negro» devido à sua pele de granito e vidro fumado, temos a nova extensão da Biblioteca Real (Søren Kierkegaards Plads) projetada pelo ateliê Schmidt Hammer Lassen. É um dos novos ícones da pequena ilha de Slotsholmen (e o café com vista para o canal, no piso térreo do impressionante hall de entrada, é ótimo para retemperar forças). As visitas guiadas incluem não só o edifício inaugurado em 1999 como a belíssima biblioteca original do início do século XX, cujas salas de leitura são toda uma viagem no tempo. As exposições do Museu Nacional de Fotografia (kb.dk), ali instalado, são igualmente recomendáveis.

Ocupando o gigantesco interior de um dos vários antigos armazéns que dão a esta zona do porto de Copenhaga o seu nome (Papirøen, ou ilha do papel), o Copenhagen Street Food (Trangravsvej, 14) é um verdadeiro arquipélago de barraquinhas e roulottes de comida de rua onde é possível jantar sem risco de naufrágio financeiro (um bem raro nesta cidade). Do Peru à Coreia do Sul, de França a Israel, todas as viagens gastronómicas são possíveis, tanto lá dentro como na esplanada junto à água – pelo menos até ao encerramento deste mercado temporário, marcado para o final de 2017.

A citadela de Kastellet ao fim da tarde e os Jardins Tivoli à noite.

Dia 3

Numa época em que o filão dos design hotels ainda estava por inventar, a companhia aérea escandinava SAS encomendou ao mais famoso dos arquitetos (e designers) dinamarqueses, Arne Jacobsen, uma obra de arte total que até hoje consta dos manuais. Inaugurado em 1960, o então SAS Royal Hotel – hoje Radisson Blu Royal Hotel (Hammerichsgade, 1) – foi integralmente desenhado por Jacobsen: da fachada exterior aos faqueiros, passando pelas alcatifas e pela escada em espiral que domina a receção. Várias remodelações e muitíssimos visitantes famosos depois, apenas um dos quartos, o 606, se mantém fiel ao projeto original.

Tal como a torre de Arne Jacobsen, o mais fotogénico dos museus dinamarqueses é um ícone modernista – só que, em vez de apontar ao céu, o edifício dos arquitectos Vilhelm Wohlert e Jørden Bø espraia-se na horizontal, debruçando-se sobre o mar e sobre a Suécia, que se avista ao longe do magnífico parque de esculturas ao ar livre do Louisiana Museum (Gammel Strandvej, 13) a trinta minutos de comboio do centro de Copenhaga.

Lá fora, o visitante cruzar-se-á com obras de Joan Miró e Alexander Calder, Henry Moore e Louise Bourgeois; lá dentro, há uma impressionante coleção de arte moderna e contemporânea, a que se somam ótimas exposições temporárias (até 22 de outubro, o Louisiana apresenta a primeira grande retrospetiva europeia dedicada a Marina Abramović) e um café-restaurante de inspiração dinamarquesa bastante conveniente. Obrigatório.

A febre da cerveja artesanal não podia deixar de estar completamente implantada na Dinamarca, país de origem de algumas das marcas de cerveja mais vendidas em todo o mundo. Um dos epicentros desta febre é o Mikkeller (Viktoriagade, 8), um pequeno bar no bairro hipster de Vesterbro, invariavelmente apinhado de gente ao fim da tarde. O destaque vai para as criações próprias da marca, disponíveis à pressão ou em garrafa, a acompanhar com um queijo bem forte e uma fatia de pão escuro, mas a lista exibe dezenas e dezenas de cervejas artesanais cuidadosamente selecionadas.

Tal como a estátua da Pequena Sereia, os passeios de barco no canal e o render da guarda no Castelo de Amalienborg, os Jardins Tivoli (Vesterbrogade, 3) fazem parte do pacote mais básico de uma estada em Copenhaga. Por maior que seja a alergia a atrações turísticas de massas, é injusto prescindir de uma visita, de preferência noturna, a este histórico parque de diversões onde noite após noite duas das mais antigas montanhas-russas do mundo (e dezenas de outros divertimentos só para os mais destemidos) continuam a pôr visitantes de todas as gerações de cabeça para baixo.

Dia 4

Não é só pela vista que vale a pena subir a rampa em espiral que conduz até ao topo da Rundetaarn, Torre Redonda (Købmagergade, 52). Mandada construir em 1642 por Cristiano IV para servir como observatório ao famoso astrónomo Tycho Brahe, este ex-líbris bem no centro de Copenhaga é também uma aula de História.

As ruas do Bairro Latino, a velha cidade universitária da cidade, são um viveiro de lojas que vale a plena explorar. O sempre surpreendente designer de moda Henrik Vibskov, por exemplo, tem aqui a sua (Krystalgade, 6). As livrarias abundam, assim como os pontos de venda de roupa vintage. Menos frequentes são lojas de discos com uma oferta de vinil tão completa (e um atendimento tão simpático) como a recém-inaugurada Sound (Fiolstraede, 26).

E quando abrir o apetite, há um local aberto desde 1877, o Schønnemann (Hauser Plads, 16). Começou por servir as suas sandes abertas de arenque fumado (e muita aguardente) a uma clientela popular maioritariamente constituída pelos carvoeiros que abasteciam a cidade. Hoje é uma instituição nacional, e até o mais famoso dos chefs dinamarqueses (René Redzepi, o génio por detrás do Noma) aqui vem regularmente deliciar-se com aquele que dizem ser o melhor smørrebrød de Copenhaga. Ultrapassadas as filas (é recomendável telefonar a reservar lugar para um dos dois turnos do almoço), a grande dificuldade aqui será escolher, já que tudo, mas mesmo tudo, tem um ar maravilhoso. Quanto à lista de snaps, o melhor é fechá-la e seguir cegamente os conselhos dos empregados de mesa.

Neste último dia, ainda vai a tempo de visitar a Igreja de São Nicolau. Foi construída no início do século XIII e é a terceira mais antiga de Copenhaga. Ou melhor: foi, já que a sua história enquanto igreja chegou ao fim em 1805. Desde então, serviu sucessivamente como quartel de bombeiros, museu naval e biblioteca pública, até que na década de 1950 se viu transformada numa das mais importantes galerias de arte contemporânea da cidade. Vocacionado para acolher exposições temporárias, o Nikolaj Kunsthal (Nikolaj Plads, 10) exibe atualmente uma coletiva de artistas japoneses.

Instalado numa das alas do Huset KBH, um complexo cultural de vários andares, o Bastard Café (Rådhusstraede, 13) é o paraíso na terra para os amantes dos jogos de tabuleiro. Talvez ninguém saiba ao certo quantos jogos é possível encontrar nas suas prateleiras (muitas centenas ou muitos milhares), mas a probabilidade de lá estar aquilo que se procura para um fim de tarde lúdico é, digamos, de 99,9%. A falta de parceiros ou de prática não é impedimento: o café está sempre cheio de jogadores solitários em busca de companhia e os gurus residentes ajudam a descodificar as regras sempre que é preciso. O bilhete para um dia custa menos de quatro euros; a comida e a bebida também são a preços de amigo.

Para o último jantar na cidade, fique a saber que Copenhaga tem um universo de bons restaurantes tão avassalador que é quase missão impossível escolher apenas um, por isso aqui vão dois (que são da mesma família). Primeira paragem: o Ved Stranden 10 (Ved Stranden, 10), um discreto e confortável bar de vinhos forrado a mobiliário modernista (lá fora, a esplanada tem vista para o Parlamento) com uma carta cheia de achados capazes de surpreender os mais conhecedores e uma seleção de aperitivos para acompanhar. Segunda paragem, a apenas um quarteirão de distância: o igualmente impecável Admiralgade 26 (Admiralgade, 26), nova investida da dupla de proprietários Christian Nedergaard e Sebastian Nellemann, onde o chef japonês Ginzo Miyata tem feito furor a cruzar técnicas orientais ancestrais com os mais frescos ingredientes locais em pratos que se comem com os olhos e logo a seguir se tornam um festim na boca.

E no fim de tudo isto, haverá vontade de voltar para casa?


Guia de viagem

Moeda: coroa dinamarquesa (DKK) 1 euro – 7,43 DKK
Fuso horário: GMT+1
Idioma: dinamarquês
Quando ir: julho e agosto, quando a temperatura é mais alta e permite aproveitar ao máximo os espaços ao ar livre, como jardins, esplanadas e a zona portuária da capital.

Ir

A TAP voa diretamente de Lisboa para Copenhaga a partir de 238,50 euros por pessoa, ida e volta. Na capital dinamarquesa aconselha-se o aluguer de bicicleta ou caminhar. Do aeroporto ao centro de Copenhaga são cerca de dez quilómetros. A viagem de comboio ronda os 5 euros por pessoa.

Ficar
Copenhaga Radisson Blu Royal Hotel
Bem perto dos Jardins Tivoli e da estação central de Copenhaga, este cinco estrelas foi um dos primeiros edifícios altos da cidade. O design é da responsabilidade de Arne Jacobsen e oferece ainda uma área de 2000 m2 de para bem-estar e fitness. O seu pequeno-almoço é uma experiência a ter em conta.
Hammerichsgade 1, Copenhaga
Tel.: +45 3342 6000
Quarto duplo a partir de 229 euros por noite.
radissonblu.com

Percorra a galeria de imagens acima clicando sobre as setas.