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Nasceu em Lisboa, cidade onde ainda vive. Canta desde os 15 anos e aos 27 deixou o emprego de arquivista do Ministério das Finanças para passar a fazer vida das cantigas. Foi a voz dos Deolinda – ou deu voz à Deolinda, como prefere dizer – e durante uma década fez mais de quarenta viagens, entre concertos, espetáculos e festivais. Se calhar até foram mais – já perdeu a conta aos muitos palcos a que subiu pela Europa, América, África e Ásia. Agora Ana Bacalhau canta em nome próprio e continua a viajar, mas para dar a conhecer o primeiro álbum. E porque precisa de o fazer, garante.

Esta é a entrevista, na íntegra, que Ana Bacalhau deu à TSF e à Volta ao Mundo. Veja o vídeo e ouça a entrevista.

Entrevista de Cláudia Arsénio (TSF) e Paulo Farinha (DN)

Qual é a sala de espetáculos mais bonita onde já cantou?
O Teatro Circo de Braga. Aqui em casa. Definitivamente.

De todos os palcos a que já subiu, pelo mundo fora, esse é aquele que se destaca?
Sim.

O que tem de especial?
A sala é lindíssima. Tem um lustre maravilhoso e uma energia incrível. Nunca falha, o público de Braga. Aquele é um palco inspirador. E tem um óptimo tamanho para um concerto intenso e ao mesmo tempo intimista. Serão perto de mil lugares, creio. Um número simpático para se manter algum contacto visual com o público. E quando as coisas correm bem e há aquelas palmas com gosto, sente-se uma forte intensidade.

E das viagens que fez até hoje, qual foi a que mais a marcou?
São duas: Estados Unidos e São Tomé e Príncipe. A primeira foi em 2007 e já a queria fazer há muito tempo. São Francisco era o meu objetivo principal, mas depois eu e o Zé [José Pedro Leitão, marido de Ana Bacalhau] decidimos alargar um pouco. De São Francisco fomos até Las Vegas de avião, daí de carro até ao Grand Canyon e novamente de carro até Los Angeles. E no final, pelo Big Sur acima até São Francisco. Foi incrível.

E essas cidades, com o imaginário que temos da literatura e do cinema, corresponderam às expectativas que tinha?
Absolutamente. Foi a minha primeira vez nos EUA e há muito tempo que queria ir a São Francisco. Costumo dizer que sou uma hippie reformada e os anos 1960 são muito importantes na minha formação. Adoro a Janis Joplin e sempre quis visitar a cidade onde ela se construiu para o mundo. Além disso, gosto muito da cultura norte-americana, que sempre me foi muito próxima. Estudei Línguas e Literaturas Modernas na faculdade – Português e Inglês – o que incluía a cultura (e literatura) norte-americana. Ora, conhecendo essa cultura de fora, pude pela primeira vez “experimentá-la”. E adorei.

Estar ao vivo no local que já se conhece.
Sim. São Francisco é uma cidade muito europeia, na sua forma de estar e de viver. Pelo menos era, naquela altura. E eu, como lisboeta, senti-me quase como em casa. Los Angeles é o oposto, o american way of life. Las Vegas é a loucura, uma cidade de faz de conta no meio do deserto. E o Grand Canyon é inimaginável, ao vivo. Avassalador. Difícil de descrever. É uma comunhão plena com a natureza.

Nas viagens grandes que faz – e sobretudo nessa, que a marcou tanto –, há espaço para o deslumbramento para além do que estava à espera? Já vimos tanto no cinema e na televisão…
Há espaço para o deslumbramento, mas também para o contrário. Para mim o deslumbramento maior foi a natureza. Por um lado o Grand Canyon, uma coisa ao mesmo tempo inóspita e violenta. Do outro, o Big Sur, com as vacas, os celeiros, o lado rural… Tudo muito aconchegante. Esses extremos são deslumbrantes. Mas depois penso em Los Angeles, com tudo tão gigantesco. Foi o sítio onde menos gostei de estar. É quase uma cidade de papel. Artificial. Lembro-me de ter ido ao Kodak [Dolby] Theatre, onde se fazem as cerimónias dos Óscares, e achei que aquilo não tem jeito nenhum. Estava à espera de uma mística extraordinária, mas não tem mística nenhuma. Eu pelo menos não a apanhei [risos].

Inspira-se nas viagens que faz para as canções que escreve?
Sim. Mesmo que não seja no momento, é sempre algo que vai ficando comigo e que fará parte de mim. Os sons, os cheiros, as pessoas que encontramos e com quem falamos… Todas essas vivências ficam connosco e nunca mais somos os mesmos. Ou seja, adicionamos. Nunca fiz uma viagem em que subtraísse. Por isso, quando vou pôr alguma ideia em forma de canção, tudo o que vi sai naturalmente. Sai para a canção.

E a outra viagem que a marcou?
Foi São Tomé, em 2015. Fomos por poucos dias, para tocar e cantar. Eu já tinha muita vontade de conhecer São Tomé e Príncipe, mas quando lá cheguei senti que era mesmo aquilo.

Foi a primeira vez em África?
Não. Já tinha ido à África do Sul, Moçambique, Cabo Verde e Marrocos.

Quando vai a locais muito diferentes da nossa cultura gosta de experimentar coisas diferentes? Como a comida, por exemplo.
Adoro experimentar. Não como carne e sou alérgica a moluscos, mas tudo o que seja fora disso, sou sempre adepta de experimentar. Sobretudo quando estou de folga ou vou de férias. Por causa da voz, em dia de concertos, tenho de ter cuidado com molhos, picantes e coisas dessas.

Em todas as viagens que fez em trabalho, consegue ter tempo para algumas visitas? Ou só consegue fazer vida entre aviões, aeroportos, hotéis e salas de espetáculo?
Não temos muito tempo para estar nos sítios, mas sempre algumas horas. Quando o destino é daqueles onde nunca fomos e sempre quisemos ir, arranjamos duas ou três horas para um passeio. Em São Tomé, por exemplo – que eu queria muito conhecer – foi o que aconteceu.

E a viagem de sonho? O país onde nunca foi mas gostava muito de ir?
São dois: Japão e Austrália/Nova Zelândia. Ainda não fui porque a minha vida não para e não consigo marcar férias com muita antecedência. A nossa agenda está sempre em aberto. Mas hei-de arranjar umas semanas ou um mês para fazer essas viagens.

Oiça aqui a entrevista, emitida pela rádio TSF, a 14 de maio de 2009


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