Aceitámos o desafio da Huawei e, de smartphone em riste, percorremos a reserva privada de Phinda «à caça» dos melhores momentos. Faltou-nos uma para os Big Five, mas voltámos da região de Kwazulu-Natal rendidos. À natureza e não só.

Texto e fotografias de Fernando Marques

Três horas e meia num avião separam Joanesburgo, a maior cidade da África do Sul, do nosso destino final: Bayala Game Lodge Reserve na região de KwaZulu-Natal. Se o nome soa familiar é porque lembra a série de televisão, dos anos 1980, sobre o rei Shaka Zulu. O alojamento faz parte da grande reserva Munyawana, formada pelas reservas privadas de Phinda e Zuka. Quarenta quilómetros separam-nos do oceano Índico e, apesar de nesta parte de África, a meio do outono, o clima ser ameno, o calor aperta ainda antes do meio-dia.

Da pista de aterragem de Phinda até ao alojamento são uns bons quarenta minutos de jipe, que se transformam numa hora, pois – para nossa surpresa – parece que os animais combinaram para fazer uma receção em grande. Pelo caminho os avistamentos foram em crescendo, de impalas a zebras, girafas e gnus e, por fim, rinocerontes. Da lista dos chamados Big Five (leão, leopardo, elefante, búfalo e rinoceronte) dois já estavam vistos a caminho do hotel. «Isto está a correr bem», comentavam espantados os jornalistas vindos de várias partes do mundo, quase todos pela primeira vez num safari. «A este ritmo amanhã já os vimos todos.» Não seria bem assim, pois alguns revelaram ser bem mais difíceis de encontrar.

O cérebro é perito em fazer jogos de associações e, por causa disso, alguma da paisagem encontrada pelo caminho até ao alojamento fazia lembrar o Alentejo. O que terá sido outrora uma zona mais luxuriante, foi transformada pelos colonos em plantações de cana e ananás, onde gradualmente voltou a haver vegetação rasteira com algumas árvores, caraterística da savana. Quem o diz é Les Carlisle, «caçador» profissional responsável pelo grupo de conservação da reserva privada Phinda: «Quando aqui chegámos isto eram quintas para cultivo de ananás, criação de gado e reservas de caça.» Les, hoje na casa dos 60 anos, não é realmente caçador, na medida em que não mata os animais. Na verdade captura-os. Foi contratado, há mais de três décadas, para reintroduzir na reserva, entre outros animais, os Big Five.

A reserva privada de Phinda tem 170 quilómetros quadrados de área. Foi formada em 1991 e tem sete diferentes ecossistemas, da savana à montanha.

Outra figura fundamental neste puzzle é Mike Kirkinis, igualmente responsável pela conservação da reserva. Consultor de ecoturismo, tem desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento de projetos que envolvem a comunidade local. Tudo isto não surge por acaso e é aqui que Les Carlisle e Mike Kirkinis concordam: «Cuidar da terra, da vida animal e, mais importante, das pessoas.» Les Carlisle continua: «Enquanto, em outras reservas, a preocupação é a diversidade animal, aqui tivemos de provar que a vida animal selvagem tem uma viabilidade económica superior à da criação de gado e de reservas para caçar. Desde o início, este projeto foi criado para ser orientado para o turismo e com isso criar retorno suficiente para comprar terrenos e empregar os locais.» Ainda assim não é uma tarefa fácil e os investidores têm de ser pacientes pois, neste caso, o lucro só surgiu passados quinze anos, conta Mike Kirkinis.

A dois metro da chita

No primeiro dia de safari, a seguir a um almoço ligeiro, tivemos direito a um game drive, que mais não é do que um passeio num jipe (adaptado para conseguir levar até dez pessoas mais o condutor) com o simples objetivo de avistarmos o máximo de animais possível. Bingo! Mais uma vez tivemos sorte: zebras, gnus, rinocerontes, uma chita e uma família de leões – mais um dos Big Five para a lista. O dia terminava em beleza e com tema de conversa para durar todo o jantar.

A vida no safari é dura, é preciso estar pronto às seis e meia da manhã para a primeira incursão do dia. A essa hora, nesta parte de África, já é praticamente dia. Ainda está fresco e o grupo de pessoas denuncia sono e excitação pela expetativa do que poderá encontrar-se pelo caminho. Depois de um pequeno-almoço frugal e muito café, é tempo de subir para o jipe onde estão mantas à espera. E tanto jeito deram até o sol aparecer por completo.

O Bayala Game Lodge Reserver tem várias zonas comuns, privilegiando a troca de experiências entre os visitantes.

Neste passeio, o ranger/guia/condutor é Dave Veldman, 33 anos, natural de Durban, chefe dos rangers que trabalham no Bayala. A sua mulher, Judy, é diretora do alojamento e o casal mora na reserva com os dois filhos de 3 e 6 anos. Dave é ranger desde que acabou os estudos, há doze anos. «Isto é o que eu sempre quis fazer, nunca tive outro trabalho», diz com uma serenidade digna de alguém que adora o que faz. Mais à frente haveríamos de encontrar uma chita e uma família de leões que estava a alimentar-se de um gnu apanhado recentemente. E seria durante estes dois encontros que a sua experiência se revelaria fundamental.

No caso da chita, que acompanhámos durante cerca de dois quilómetros, «o segredo é aproximarmo-nos devagar e diagonalmente em relação ao animal. Ele assim avalia se somos uma ameaça e, quando percebe que não somos, segue a sua vida como se não estivéssemos aqui.» A verdade é que passado pouco tempo a chita encontrou um local onde se sentia segura e ficou a descansar, tranquilamente, ignorando-nos, embora estivéssemos apenas a escassos dois metros de distância. Já a família de leões que se alimentava despertava um certo nervosismo no grupo, já que rugem de forma bastante ameaçadora enquanto comem. Tratava-se de uma família patriarcal, em que primeiro come o leão e só depois comem a leoa e os filhotes. Com eles, Dave aproximou-se igualmente devagar, oblíquo à família e esta continuou a alimentar-se como se
não existíssemos.

Construções sustentáveis, ao jeito das aldeias locais, são as escolhidas para estes alojamentos na savana.

O ritmo das saídas em jipe chegou às quatro por dia, duas de manhã e duas à tarde, podendo haver ainda uma à noite. Isto pode parecer repetitivo e monótono, mas a verdade é que não é. Todas as saídas são diferentes e é certo que em algumas é preciso alguma paciência, pois os Big Five não aparecem ao ritmo que gostaríamos. Isso também faz parte do lado imprevisível do safari. No entanto, ninguém é obrigado a seguir este programa, delineado para que tivéssemos oportunidade de ver o maior número de animais possível durante a nossa estada.

É possível escolher quantos passeios queremos fazer, a duração e até o que incluir: podemos fazer um piquenique, almoço com mesa posta e flûte de champanhe ou um lanche acompanhado de uma cerveja ao pôr do Sol. É nesta altura que faz sentido o lugar-comum: «Não há nada como o pôr do Sol numa savana africana.» Por momentos parece que estamos numa cena do filme África Minha e ao vermos uma avioneta a cruzar os céus achamos que poderia ser Robert Redford a chegar. Sim, parece piroso, mas é preciso mesmo ver para crer. É qualquer coisa única, a imensidão da paisagem, as cores quentes, quando observadas a partir de um local elevado vão ficar gravadas na nossa memória.

Tudo por um corno de rinoceronte

Nesta latitude, assim como o dia nasce cedo, a noite também cai cedo, e de repente, às seis da tarde, já o céu está pintado de escuro. O jantar não foi servido no lodge, como de costume. Tivemos direito a um repasto no meio do mato. Mais uma vez, ao chegar ao local deparamo-nos com um cenário digno da sétima arte. Uma receção com gins variados, mesas como se de um restaurante de fine dining se tratasse, candeeiros pendurados nas árvores a lembrar os antigos a petróleo, várias fogueiras e um churrasco à moda local (braais) com carnes variadas e maçarocas de milho, entre outros acompanhamentos. Claro que o lugar é meticulosamente escolhido, mas como os animais andam por onde lhes apetece, esta é a primeira vez que vemos guardas com armas de fogo de prevenção.

Esta aldeia de Velakukhanya – e a sua escola primária e secundária – fica nos limites da reserva de Phinda.

As armas de fogo voltam a ser mencionadas e desta vez por um motivo bem mais preocupante. Uma ameaça sobre os animais da reserva obriga a que tenham de ser feitas patrulhas com guardas armados. Especialmente durante a noite. Trata-se da caça furtiva aos rinocerontes negro e branco por causa dos seus cornos. Estima-se que tenham sido mortos mais de mil só na África do Sul, em 2017, de tão apreciados que são, especialmente na Ásia, pelas supostas qualidades afrodisíacas e medicinais para curar uma série de maleitas. Os cornos são ainda considerados um símbolo de estatuto social, quando exibidos numa prateleira numa sala de estar, chegando a atingir valores de cem mil dólares (cerca de 85 mil euros) por cada quilo no mercado negro.

A verdade é que não há nada de mágico na composição do corno. «É feito de queratina, tal como as nossas unhas e cabelo», explica Mike Toft, veterinário com quarenta anos de experiência no terreno e responsável pela conservação dos rinocerontes na reserva. Lembram-se do lucro que Mike Kirkinis dizia demorar quinze anos a atingir? Pois, neste momento, uma boa parte dele é gasto na prevenção da caça furtiva. Uma das formas de o fazer é pelo dehorning, ou seja, o corte do corno dos rinocerontes, que é executado por Mike Toft e a sua equipa de oito pessoas. O processo é dispendioso, custando cerca de 1500 euros por intervenção, e tem de ser feito a todos os animais a cada dezoito meses, como nos conta Mike Kirkinis.

Todos os dias, em cada saída, são avistadas dezenas de animais de várias espécies. Entre eles, os Big Five.

O número exato de rinocerontes na reserva não é divulgado por razões de segurança. Além de ser cara, toda a operação é também bastante complexa por causa dos meios humanos e materiais usados. Um helicóptero passou a fazer parte da operação, facilitando a localização do animal para depois o atingir com o dardo tranquilizante – só assim tornando possível a intervenção. A droga leva cerca de oito minutos a fazer efeito, mas por vezes os animais resistem continuando a andar, outras vezes caem direitinhos e têm de ser virados para um dos lados, protegendo-os de se magoarem com as suas duas toneladas de peso em cima das pernas.

A partir do momento em que a equipa coloca o rinoceronte o mais confortável possível no chão, tapa-se-lhe os olhos e os ouvidos, pois isto ajuda a que se acalme por não ver nem ouvir o que se está a passar à sua volta. A partir daqui é uma espécie de contrarrelógio, fazendo lembrar um carro de corrida quando vai à box: cada membro da equipa sabe exatamente o que fazer. O animal tem de ser arrefecido com água durante todo o tempo, são retiradas amostras de sangue e pele, feitas medições e a preparação para o corte do corno. Esta parte pode parecer brutal por causa da ferramenta utilizada, uma motosserra. «Esta é a maneira que nos permite fazê-lo da forma mais rápida e eficaz», explica Mike Toft. «O processo não causa nenhuma dor ao animal, é como se cortássemos as nossas unhas. Só temos de ter o cuidado de não cortar rente demais.»

A cada dezoito meses, o veterinário da reserva procede ao Dehorning. É a forma de salvar os rinocerontes.

Ao pedaço de corno é retirada uma amostra de ADN e depois de catalogado segue para ser destruído. É assunto verdadeiramente sério e uma das razões por que esta reserva é uma das menos afetadas pela caça furtiva. Para se ter uma ideia de como levam a sério a prevenção, todos os anos as equipas no terreno são sujeitas a testes de polígrafo com o intuito de se saber se poderão ter passado informações sensíveis a possíveis malfeitores.

«Nada disto faz sentido sem o envolvimento da população local. A razão do sucesso da reserva Phinda deve-se ao facto de a comunidade perceber o benefício direto que esta lhes proporciona», conta Les Carlisle. Esta é a outra razão que faz que a reserva exista há 27 anos. «Quando aqui chegámos, reunimos com a comunidade e pedimos que fizessem uma lista do que precisavam, em vez de lhes dizer que tínhamos X dinheiro para gastar. O dinheiro estraga tudo. Se tivesse sido ao contrário, teriam colocado na lista o que gostariam de ter, e não o que realmente precisavam», explica Mike Kirkinis.

A criação de emprego é outro motivo de orgulho: «Esta zona é uma área remota da África do Sul, não há indústrias e o trabalho é sazonal, sobretudo na apanha de ananás. Criámos mais de setecentos postos de trabalho sempre com o lema de lhes dar ferramentas para conseguirem o que precisam.» Exemplo disso foi a construção da escola primária e secundária de Velakukhanya numa aldeia próxima da reserva. O projeto só avançou depois de a comunidade garantir que o governo enviaria professores para dar aulas. «O país está repleto de escolas vazias e não era isso que queríamos que acontecesse aqui. Cometemos erros, mas temos feito mais bem do que mal ao trabalharmos com as pessoas e não para elas», conclui Mike.

Dave Velman, sul-africano, foi o guia que nos acompanhou nesta viagem pela reserva de Phinda.

E se à chegada a Phinda tivemos a sorte de ver logo alguns dos animais mais imponentes da savana, até ao fim da nossa viagem à África do Sul não trocámos olhares com nenhum leopardo e o elefante foi já de malas feitas no jipe, a caminho do aeroporto. Imprevistos da vida animal selvagem no seu estado mais puro.


Fotografar com telemóvel?

O fotógrafo Fernando Marques compara máquina e smartphone e revela-nos alguns truques e surpresas.

Fotógrafo Fernando Marques

A premissa para fazer este safari pareceu-nos ambiciosa. Fotografar animais com um telemóvel não seria a nossa primeira escolha, mas a verdade é que a maioria das pessoas usa o smartphone para fotografar tudo, incluindo as férias. Ciente disso, a Huawei tem vindo a criar dispositivos com bom desempenho fotográfico, através da sua parceria com a Leica. E neste caso utilizámos o Huawei P20 Pro, modelo topo de gama que a marca diz que vai rivalizar com máquinas digitais reflex dedicadas. Será que consegue? Já lá vamos.

As especificações da componente fotográfica são impressionantes: três lentes, zoom híbrido 5x, 40 megapixels e a possibilidade de gravar em formato raw – motivos suficientes para chamar a atenção de todos os que dão importância à fotografia. A realidade mostra-nos que a qualidade é muito boa em quase todas as situações, chegando a ser excelente em algumas.

Uma das funcionalidades que testámos foi o zoom. Alguns animais estiveram apenas a três metros de distância mas ainda assim foram um desafio para o P20 Pro. O zoom híbrido 5x mesmo assim não era suficiente para encher o ecrã com os bichos, sem ser à custa da perda de qualidade da imagem. A opção foi ficar pelo zoom ótico 3x.

As fotografias que íamos fazendo eram muito boas, mas estávamos intrigados com o resultado final, parecia sempre que tinham levado um filtro do Instagram. Percebemos que era a AI (Assistente Inteligente) que estava a intervir, outra novidade introduzida, que deteta o tipo de cena que estamos a fotografar, melhorando-a: o azul do céu numa paisagem, o verde das plantas, os olhos do animal de estimação, o detalhe da comida – são dezanove critérios ao todo. Há algum exagero ao fazê-lo, por isso resolvemos desligar a função.

Verdadeiramente surpreendente é o modo noite que, ao tirar uma sucessão de fotos, junta-as e o resultado final é uma foto incrível, que bem podia ter sido tirada por uma máquina reflex num tripé. Vale mesmo a pena usar e abusar deste modo. Já os fãs de fotografia a preto e branco vão adorar esta função, pois usa uma das lentes destinadas para isso mesmo, e fá-lo de maneira exemplar. As fotos obtidas com o sensor dedicado a preto e branco com 20 megapixels têm muita qualidade e as texturas são cheias de detalhe.

Quem gosta de tirar selfies não foi esquecido. Há para isso uma câmara frontal com 24mp e a Huawei aqui foi mais longe dando vida à frase que mais se ouve depois de tirar selfies – «depois passa isso no Photoshop…». O item «beleza» permite definir o grau de intensidade. Tira rugas, papos nos olhos e alisa a pele. Se exagerarmos corremos o risco de ficar como um boneco de cera do Museu Madame Tussaud. Já o modo retrato faz aquilo que tanto se gosta de ver em fotos tiradas com máquinas reflex – desfoca tudo à volta realçando aquilo que se está a fotografar, sendo particularmente eficaz em rostos.

Recomendamos a exploração do modo Pro. Este imita as opções disponíveis numa máquina DSLR, permitindo controlo sobre definições como abertura, velocidade ou balanço de brancos.

Neste P20 Pro nem tudo é fotografia. Também faz vídeo com possibilidade de 4K, mas com pena nossa sem estabilização. Estabilizado só 1080p@30fps. Revelou-se eficaz a estabilizar os vídeos em andamento no jipe durante o safari e ainda permite filmar em câmara lenta a 960fps mas também aqui só na qualidade 720p.

A velocidade com que abre aplicações e alterna entre elas é exemplar. É possível tirar fotografias à impressionante velocidade de 0,3 segundos, sempre com resultados excelentes. São muitos os fotógrafos que gostam de ter uma câmara de reserva quando estão em trabalho. Este Huawei P20 Pro vem facilitar-lhes a vida por um lado (as fotos rivalizam com as de máquinas dedicadas), e dificultar por outro, pois a facilidade de utilização e a consistência dos resultados não vão tornar fácil a escolha entre a câmara tradicional e este telefone, que com as suas três lentes e muita inteligência artificial está mesmo muito esperto.


Guia de viagem

 

Documentos: Passaporte
Moeda: Rand (ZAR). 1 euro – 15,5 ZAR
Fuso Horário: GMT +1 hora
Idiomas: Inglês, Africânder, Zulo ou Xhosa

Ir

Voe de Lisboa para Durban com a South African Airways (flysaa.com), por
1500 euros por pessoa, ida e volta. A viagem de carro até Phinda tem a
duração de três horas.

Ficar

O Bayala Game Lodge tem 24 quartos com ar condicionado. A construção
é feita com materiais sustentáveis como a palha usada no telhado. As
refeições são servidas no lodge, sendo de destacar o pequeno-almoço
que é muito completo. Alojamento a partir de 125 euros por pessoa.
Saiba mais em gamelodgekwazulunatal.com.


Agradecimentos

A Volta ao Mundo viajou a convite de


Reportagem publicada originalmente na edição de agosto de 2018 da revista Volta ao Mundo, número 286.

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