Não são poucos os portugueses que passam pela experiência de estudar uma temporada noutro país. Aos que se preparam para o fazer no próximo ano letivo, esta é a altura certa para esclarecer algumas questões sobre o tema.
Texto de Mariana Botelho
Não há dúvida de que estudar no estrangeiro é uma experiência memorável. Que o confirme qualquer pessoa que já passou pela experiência. Mas será aconselhável a qualquer caso? Que atenções se deve ter previamente? Como escolher o país de acolhimento? Sobre estes e outros pontos, a Volta ao Mundo foi se esclarecer junto da pedopsiquiatra Paula Medeiros, membro do Centro da Criança e do Adolescente do Hospital CUF Descoberta, em Lisboa.
Comecemos por responder à questão inicial: não, nem todos devem estudar no estrangeiro. A quem o faz, a experiência é sem dúvida uma mais-valia a nível pessoal, mas também académico e laboral. Contudo, antes de se pensar nos vantajosos resultados há que considerar que há personalidades menos predispostas a todas as mudanças que acarreta a decisão de estudar «lá fora».
«As pessoas são diferentes e, para alguns, não faz sentido ter esta experiência. Se não houver motivação própria, não se deve ir de Erasmus [ou outro programa do género]» começa por explicar Paula Medeiros, certa de que «a decisão de estudar no estrangeiro e a seleção do local devem sempre partir do próprio estudante». Ainda assim, «aconselha-se uma reflexão familiar conjunta», conclui.
Aos olhos da pedopsiquiatra, «o estudante que vai fazer Erasmus gosta de comunicar, conhecer pessoas de outras culturas, viajar… Ajuda se for extrovertido, aventureiro, seguro e confiante», ainda que estas caraterísticas não limitem o tipo de jovem que decida estudar fora do país.
Do lado oposto, temos «uma personalidade demasiado inibida ou mesmo alguém que sofre de ansiedade social, fique facilmente inseguro e não lide bem com a mudança de rotinas. A esta personalidade, não é habitualmente aconselhada a experiência Erasmus», reconhece a especialista que alega serem vários os jovens que não se identificam com nenhum destes extremos e também se aventurem a sair do país para estudar.
A todos eles, é aconselhado uma vasta ponderação de prós e contras. Diz Paula Medeiros que «alguns jovens, pela sua normal impulsividade, desejo de aventura e conhecimento de novas realidades agem refletindo menos do que deveriam. A ação sobrepõe-se à razão» e é por isso que uma consulta do parecer da família deve ser o primeiro passo. A par disso, será útil conhecer relatos de outros estudantes que passarem por aquela experiência – algo facilmente encontrado online.
Nada desta ponderação é em demasia. E sobre este ponto a especialista aponta a cultura portuguesa: é que se, nalguns países, sair de casa aos 15 anos é comum, em Portugal a realidade é diferente.
«Em Portugal, a realidade difere da de outros países. A mãe latina é geralmente muito protetora e executa quase todas as tarefas domésticas»
Por cá, «os jovens ficam normalmente em casa dos pais até tarde, seja pela comodidade como pela impossibilidade financeira de independência». Além disso, «a mãe latina é geralmente muito protetora e executa quase todas as tarefas domésticas. Além disso, existe um significativo sentido de proximidade familiar». Estes são pois aspetos práticos de que o jovem deve estar ciente de que irá abdicar ao partir para Erasmus. Antes da experiência, Paula Medeiros aconselha a que o jovem «seja treinado para a realização de aspetos necessários à sua vivência “a solo”».
Uma experiência para a vida
Esclarecida a questão de que esta é uma decisão que deve partir do jovem, que não se deve sentir pressionado a passar pela experiência só porque «todos o fazem», importa referir os pontos de que o mesmo usufrui quando passa pela experiência. Se a reunião familiar é essencial para que a decisão seja bem ponderada a todos os níveis (também a nível mais prático, como os custos a que a viagem implica, por exemplo) perceber que o jovem irá crescer a vários níveis em poucos meses deve ser um argumento a favor desta decisão.
A nível pessoal, diz a pedopsiquiatra do Hospital CUF Descobertas que «os estudantes vão adaptar-se a outra cultura, outra língua, outra rotina. Aumenta também a possibilidade de viajar por locais desconhecidos». Isto leva a um maior «relacionamento com novas pessoas, o que se traduz em mais respeito pela diversidade, necessidade de partilha e por vezes até de espaço físico que alargam horizontes». Em suma, dá «mundo» aos estudantes.
A par deste lado mais romântico, mas ainda em relação às mais-valias a nível pessoal, Paula Medeiros lembra ser crucial «a realização de tarefas domésticas, compras do quotidiano, organização de despesas e resolução de aspetos burocráticos». Tudo isto leva a um inegável aumento de sentido de responsabilidade, de onde nasce uma maior maturidade emocional, ainda mais se o jovem sentir necessidade de realizar um part-time para contribuir para o financiamento da experiência.
«Estudar no estrangeiro é uma experiência que dá “mundo” aos jovens»
Já a nível académico e profissional, «o contacto com outras universidades e diferentes métodos de ensino resultam num enriquecimento curricular muito importante, que é tido em conta na altura da seleção profissional», assim como o aperfeiçoamento numa língua estrangeira, garante a especialista que sabe que o interesse por parte das empresas não se fica por aí. São também valorizados fatores de inteligência emocional como a capacidade de arranjar soluções em situações desconhecidas, o sair da zona de conforto ou a capacidade de adaptação a novas realidades.
Escolher o destino
Comecemos pela língua: por muito desenrascado que seja o jovem, importa ponderar a ida para o estrangeiro se não houver qualquer conhecimento da língua em questão. «Tal pode dificultar demasiado a permanência no país diverso», alega Paula Medeiros.
A distância é outro aspeto a considerar. Além dos custos poderem ser mais difíceis de se suportar, caso o país a escolher seja demasiado distante, «deve igualmente ser tido em conta que uma deslocação maior está habitualmente associada a uma redução de viagens ao local de residência permanente. Ora, um estudante que requeira uma maior frequência de visitas à família, namorado ou amigos deverá escolher um local de Erasmus que se situe a poucas horas de voo de Portugal», sugere a especialista, certa de que a proximidade digital não substitui a relação presencial.
Como terceiro ponto essencial à escolha do país de destino, aponta-se a motivação de cada estudante. É ele quem irá fazer daquela uma experiência única e pessoal. Se fazer Erasmus no sul da Europa é «seguramente diferente de num país do centro ou norte da Europa, a mudança de realidade vai ser bem mais acentuada se a experiência de estudar no estrangeiro for feita noutro continente».
Em todo o caso, tanto o jovem como a própria família podem contar com a garantia de alargamento de horizontes a nível pessoal, académico e profissional. Dito isto… vamos fazer as malas?
Em Portugal são muitos os que se desafiam nesta aventura. Percorra a fotogaleria acima e conheça os números referentes a esta realidade a nível nacional.
As cidades preferidas dos estudantes portugueses para fazer Erasmus