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É um dos Dead Combo, ao lado de Pedro Gonçalves, mas também se mantém ativo a solo e noutros projetos paralelos. Experimentou uma guitarra elétrica pela primeira vez aos 15 anos e nunca mais quis outra coisa. Casado, com três filhos, viaja pelo mundo do underground e ajudou a trazer este estilo para a ribalta quando se sentou a uma mesa com Anthony Bourdain, em Lisboa, a comer conservas. E o mundo prestou atenção aos Dead Combo.

Entrevista de Cláudia Arsénio e Ricardo Santos

Boa tarde, Tó Trips.
Boa tarde.

Alguém com esse último nome tem mesmo que estar num programa de viagens.
(Risos)

A música dos Dead Combo é, já por si, uma volta ao mundo?
Sim, graças aos Dead Combo fartei-me – fartámo-nos, tanto eu como o Pedro – de viajar, embora a cena das viagens… sempre considerei que as pessoas (mesmo antes de começar a viajar) que viajavam eram pessoas que sabiam mais acerca das culturas do resto do planeta. Normalmente são pessoas mais tolerantes e que preservam mais a liberdade.

As viagens também servem como inspiração para a música que faz?
Sim, as viagens servem como uma inspiração. Sei lá… até fiz um disco a solo, o meu primeiro disco a solo, e foi baseado nas viagens que fiz com a minha mulher. Acho que qualquer coisa pode servir de inspiração, mas as viagens, que ainda por cima são uma coisa que estás a presenciar e a viver na altura – nem que seja numa pequena parte da tua vida – são coisas que ficam para sempre. Assistes e tens experiências que não tens no dia a dia. É uma coisa que, pelo menos, ensino aos meus filhos. Tenho dois mais pequeninos que ainda não dá, mas a minha filha agora está a fazer o Interail, que é uma coisa que acho que ela fez muito bem. Vai entrar na Faculdade, mas se quisesse estar um ano sem entrar na Faculdade, tanto eu como a minha mulher, aconselhámo-la. Ela andava a aprender coreano, à conta de uma banda, e até lhe disse que se quisesse ir para a Coreia do Sul, arranjar um programa de voluntariado, viajar antes de decidir o que quer fazer, isso seria fixe.

Gostava de ter feito isso com a mesma idade dela?
Sim, gostava. Quando tinha a idade da minha filha… Ela tem 18, eu tinha 16 ou 17, ainda me lembro de ir à Jugoslávia, a antiga Jugoslávia (agora já não existe), no meu primeiro Interail. Fiz uma viagem por Espanha de comboio e mais dois Interails. Das melhores coisas que se fizeram na Europa foi esta história do Erasmus, é das coisas mais importantes que existem e foram feitas na Europa, esse lado de trocar culturas. Sei lá… lembro-me de ir tocar com os Dead Combo a uma cidade – fizemos 5 ou 6 concertos, uma pequena tour na Alemanha -, acho que era Munster, chegámos tarde e até perguntámos onde é que havia um sítio para beber um copo. Tocávamos no dia seguinte e tínhamos chegado à noite, de carrinha e disseram-nos que o único sítio aberto era um bar espanhol. Chegámos lá e estava cheio de miúdos, desde alemães, espanhóis, miúdos de todo o lado, tinham um ar de Erasmus e achei piada porque toda a gente estava a dançar música latina. Pensei assim: há uns anos, se não fosse esta história dos Erasmus, do alemão que tem uma namorada espanhola ou portuguesa, esta mistura toda, se calhar estes miúdos todos não estavam a dançar música flamenca ou sei lá o quê. Esse lado das viagens é super importante.

As férias grandes na Covilhã, quando era mais novo, foram as primeiras aventuras no mundo das viagens?
Sim, eu era um miúdo da cidade e, de repente, a minha avó da parte da minha mãe era caseira. E deves imaginar, isso para um miúdo pequeno… as férias grandes era ir um mês com os meus pais para a Praia das Maçãs e mês e meio a dois meses para a Covilhã, porque aí podia andar todo sujo, podia ir ao rio, podia ir com os meus tios apanhar milho e vir em cima da carroça, havia assim um lado um bocado mais Huckleberry Finn, vá lá. A minha primeira viagem de avião foi um amigo de meu pai, que trabalhava na TAP, que me pagou uma viagem para ir ter com uma namorada minha a Tavira. Ofereceu-me a viagem de avião Lisboa-Faro.

Desde então, muitas viagens. Quando é que vale a pena sempre voltar? Quais as que marcaram mais?
Uma viagem de que gostei imenso foi com a minha mulher e com um casal amigo. Na altura tinha um jipe e fomos para Marraquexe. Fomos para Marrocos: Essaouira, Marraquexe, Ouarzazate, Fez e adorei essa viagem. Nova Iorque sempre foi um lugar eleito, embora da última vez que lá estive com os Dead Combo já não achei assim muito… achei aquilo muito turístico, muito massivo. Outra viagem que ficou para sempre, para mim, foi São Tomé, onde fui com a minha mulher. Já tinha estado em Cabo Verde, nunca fui a Angola ou Moçambique, mas de África já tinha estado três vezes em Cabo Verde. Nunca tinha ido a um sítio onde é a selva. Nem sabia que ainda existia aquela África, das palmeiras, das arribas com coqueiros a cair no mar. Tivemos lá uma situação. Eu e a minha mulher fomos com um amigo que fizemos lá – ela depois até acabou por fazer um documentário acerca de expulsarem as pessoas do ilhéu das Rolas. Ele levou-nos a um sítio, ao fim da tarde, onde nos disse para estarmos calados. Depois batemos as palmas e aquilo eram milhares e milhares de morcegos no meio daqueles coqueiros, tudo a levantar. Parecia uma imagem do Batman, sei lá… incrível. Depois levou-nos lá à parte sul, onde não chegam lá turistas, a uma falésia gigante cheia de coqueiros a cair no mar, que eu nunca mais vou esquecer na vida.

O encontro com Anthony Bourdain, para o programa No Reservations, trouxe mais carimbos no passaporte?
Sim, abriu-nos as portas a um outro tipo de público também. A pessoal mais finesse que começou a gostar dos Dead Combo. Ainda hoje recebemos mensagens de pessoas em vários sítios do mundo a dizer: «Vi agora o episódio, não conhecia a vossa música, parabéns».

Que viagem de sonho falta fazer?
Adorava ir… mas isso é tipo um fetiche, porque um dos filmes da minha vida é a Revolta na Bounty. Há duas versões: uma com o Marlon Brando, a cores, e há uma outra mais antiga, não sei se é com o Errol Flynn, a preto e branco. Eu gosto dessa versão com o Marlon Brando e já vi esse filme, sem exageros, para aí umas vinte e tal vezes. E aquilo passa-se no Pacífico e portanto, desde esse filme e desse imaginário, e também tem a ver com a música, adorava ir às ilhas Fiji.

Oiça aqui a entrevista, emitida pela rádio TSF.


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