A ilha que está, por enquanto, fora dos roteiros do turismo de massas de Cabo Verde tem boas razões para a conhecermos. História, praias desertas, música e bom peixe… É possível querer mais?

Texto de Carla Macedo
Fotografias de João Viegas Guerreiro

Cabo Verde orgulha‑se de ter a primeira rua calcetada construída fora da Europa. Foi na Cidade Velha que pouco depois de esta antiga capital ter sido fundada, em 1462, se terraplenou o terreno e se empedrou o chão para dar mais dignidade ao lugar. A Rua da Banana, assim se chama a via pavimentada mais antiga de África, é um monumento inserido numa povoação que está, desde 2009, na lista do Património da Humanidade catalogado pela UNESCO.

Os portugueses fundaram aqui o primeiro assentamento colonial subsariano e, durante anos, esta cidade foi a capital portuguesa não só do arquipélago que se foi descobrindo aos poucos, como de todas as feitorias plantadas na costa ocidental africana. Santiago foi a primeira ilha de Cabo Verde a ser descoberta, em 1460, e os monumentos que ainda hoje resistem dessa fase inicial de ocupação do território – a Rua da Banana, a igreja manuelina de Nossa Senhora do Rosário e o Pelourinho –, todos edificados antes do fim do século XV, demonstram a emergência que os governadores tinham em tornar este território, originalmente sem habitantes, num lugar de dignidade europeia.

Há histórias que enchem o imaginário cabo-verdiano e que confirmam essa mesma dignidade antiga. A que se conta junto à lápide que assinala a visita do padre António Vieira à ilha é uma delas. Consta que, quando o padre jesuíta português chegou à Cidade Velha, a caminho do Brasil (ou melhor, do estado do Maranhão que à época era um território com administração distinta da do Brasil) em 1652, ficou espantado com a qualidade dos padres de Santiago: «Há aqui clérigos e cónegos tão negros como azeviche; mas tão compostos, tão autorizados, tão doutos, tão grandes músicos, tão discretos e bem morigerados, que podem fazer inveja aos que lá vemos nas nossas catedrais», pode ler‑se numa das epístolas reunidas nas Cartas de Cabo Verde, escritas nos cerca de vinte dias que o jesuíta terá passado na ilha de Santiago. Diz‑se que os padres locais falavam latim entre eles e muito melhor do que os padres de Portugal.

A Cidade Velha, primeira capital de Cabo Verde, foi construída num oásis verde sobre o mar.

A Cidade Velha nem sempre se chamou assim. Teve como primeiro nome Ribeira Grande, uma descrição geográfica exata do lugar. A povoação foi erigida no sopé de um grande promontório cortado ao meio por um curso de água. Hoje, o leito da ribeira é apenas um caminho sem água por conta da grande seca que está a afetar o país, mas o verde fulgurante da vegetação e as hortas férteis que se veem da estrada mostram que as reservas de água, neste subsolo, ainda são abundantes.

Devia causar uma sensação tremenda quando, depois de dias no mar, se chegava a este lugar: uma terra vulcânica que se ergue quase até ao céu e no meio das montanhas pretas encontrar um oásis verde, fértil, com árvores muito altas e que cheira ainda hoje a fruta doce em toda a parte. Virada a sul e protegida do vento pelos promontórios, com água doce abundante, que melhor lugar haveria para fundar uma cidade?

Foi por causa da água doce que Ribeira Grande, como era nomeada na altura, cresceu – porque tinha condições para a própria subsistência. Teve mais de quinhentos edifícios construídos, sete igrejas, um hospital, um paço episcopal. Hoje resta muito pouco dessa glória: a Sé Catedral, duzentos metros acima do nível do mar, está em ruínas, mas testemunha, com as suas grandes dimensões, a importância de outros tempos.

O Forte de São Filipe, mais acima, hoje completamente renovado com fundos espanhóis, denuncia uma das razões do declínio – os ataques de piratas, entre os quais o corsário Francis Drake que, ao serviço da rainha de Inglaterra, atacou a cidade duas vezes durante o século XVI. Mesmo com esta proteção, com os canhões de ferro das ameias a apontarem para o mar, a exposição aos mercenários continuou. A esta ameaça juntou‑se outra: a insalubridade das águas da ribeira, que em 1760 ditava a perda do estatuto de capital. Assim se iniciava o declínio de Ribeira Grande.

A Cidade Velha terá ficado desabitada durante largo período e a população que hoje ali vive terá descido das montanhas já no início do século XX, num período de seca, para aqui se estabelecer. O que hoje encontramos naquele lugar é a mistura dessas duas colonizações – as fundações de uma cidade renascentista e o aproveitamento desses edifícios para a habitação popular. Mas os vestígios do passado glorioso ainda são muitos. Na zona do Pelourinho, que se mantém firme e hirto em frente ao mar, sucedem‑se os restaurantes e, claro, o peixe na grelha é o prato principal em todos eles.

Mal seria se os barcos coloridos que se juntam na praia não saíssem para o mar numa terra como esta e não trouxessem o fruto da pesca diretamente para os restaurantes. O processo é simples: pesca‑se à linha no mar alto, traz‑se o atum, a garoupa, o dourado (diferente da dourada) para terra, as mulheres trazem os mais leves (com cerca de sete quilos) à cabeça para vender, os homens jovens trazem os peixes mais pesados nos braços. Enquanto almoçamos no Tereru di Kultura é ali apresentado um atum com quinze quilos que será desmanchado e servido ao jantar.

O Tereru di Kultura é um desses restaurantes em frente ao mar, na zona do Pelourinho. O chef Hélder Martins, que é também o coordenador do curso de cozinha da Escola de Hotelaria e Turismo de Cabo Verde, tem aqui uma esplanada virada para o mar onde são servidos os peixes acabados de pescar, confecionados na grelha ou no forno a lenha. A lenha são também feitas as pizas (deliciosas) que marcam a diferença da oferta gastronómica deste restaurante. Hélder vive há nove anos em Cabo Verde e diz que não podia estar mais contente com a escolha que fez. O português fala do ritmo de vida suave e da amabilidade das pessoas. Conta que é habitual as crianças da Cidade Velha brincarem juntas na rua e comerem em casa umas das outras, na casa que calhar: «Há sempre alguém que oferece o almoço.» Essa vida comunitária inclui também os que vêm de fora: «Há uns tempos tive aqui no restaurante um casal com um filho, que não era de cá. A páginas tantas ninguém sabia do miúdo. Fomos dar com ele na casa de uma senhora aqui perto a comer com as outras crianças.»

Em Santiago é difícil sentirmo‑nos estrangeiros, sejamos crianças ou adultos. Os rapazes que jogam à bola na pequena praia de seixos da Cidade Velha nem dão por nós, as mulheres que vendem doces na rua acham estranho não sabermos o que é o doce de calabaceira que parece gila, a peixeira não acredita que não temos um grelhador em casa para fazer no carvão o peixe tão fresco que está a vender. O turismo em Santiago não está massificado e talvez por isso ninguém duvide de que também nós podemos ser habitantes
locais.

Praia

São apenas doze os quilómetros que separam a Cidade Velha da cidade da Praia, a atual capital de Cabo Verde. O caminho faz‑se pela costa de escarpas que se precipitam no mar azul. As vacas e os cães são uma constante ao longo do caminho, são magras as primeiras, por causa da escassez do pasto. Já as cabras andam ágeis e gordinhas, completamente adaptadas às condições mais agrestes dos últimos anos.

A natureza é dura nesta terra. Para norte ficam os picos das montanhas mais altas da ilha de Santiago, como o pico da Antónia que, com 1394 metros de altitude, é o ponto mais alto da ilha. Até pode parecer que não é nada de especial, sobretudo se tivermos como referência o pico da ilha do Fogo que atinge quase os três mil metros de altitude, mas a forma abrupta como a rocha Antónia sobe acima dos planaltos mais suaves torna‑a impressionante. São quase visíveis as erupções vulcânicas violentas que aqui ocorreram e levantaram esta terra do mar.

Em Cabo Verde vive‑se devagar. Nem a capital do país escapa ao ritmo suave.

Na paisagem quase lunar estão também enormes pedregulhos de centenas de toneladas originários na vizinha ilha do Fogo. De acordo com estudos recentes, essas rochas viajaram os 55 quilómetros que separam uma ilha da outra por mar, empurradas por um enorme maremoto que ocorreu há 73 mil anos depois de um colapso de parte do cone do vulcão do Fogo.

A caminho da cidade da Praia vemos outro fenómeno curioso: as casas estão na sua maioria por acabar. «É uma maneira que têm de não pagar impostos. Enquanto as construções não são dadas como terminadas, a câmara municipal não pode cobrar as taxas», ouvimos dizer no táxi. Não são as únicas, no entanto, com ar de estaleiro.

Quem vem do lado oeste da ilha, entra no território da Praia pelo meio de obras: o campus universitário da capital cabo-verdiana está em expansão e os camiões entram e saem de uma grande área fechada a um ritmo frenético. «É investimento chinês. Os chineses estão a entrar e força.» São de facto 45 milhões de euros, inteiramente financiados pelo governo chinês, que colocarão de pé em 2020 o que é nas palavras do primeiro‑ministro do arquipélago, Ulisses Correia e Silva, «um campus moderno, funcional e ao nível dos campus universitários de países mais desenvolvidos.» Para que não restem dúvidas aos que por ali passem, os carateres chineses desenhados a vermelho assinalam a presença asiática.

Mais à frente, já dentro da cidade, outro estaleiro asiático: a Macau Legend tem a cargo a construção de um resort que terá hotéis, um casino, um centro de convenções e um terminal de cruzeiros. O investimento necessário para a transformação do ilhéu de Santa Maria e da praia de Gamboa até 2019 é de 250 milhões de euros, segundo a imprensa macaense. A expetativa é que este investimento mude totalmente a zona da orla marítima da Praia e que aloje grande parte do milhão de turistas que o governo espera receber em Cabo Verde, por ano, a breve trecho. Em 2017, os turistas que tinham pisado o território até setembro eram mais de quinhentos mil. Mas o ritmo de crescimento anual faz supor que em 2019 o milhão seja alcançado.

Por enquanto, e para lá das obras, a vida na Praia continua pacata. No Plateau, onde nos instalamos, percebemos bem a escolha deste lugar para capital da ilha, preterindo a Cidade Velha. Deste planalto vê‑se o porto inteiro e o mar mais além. Desta situação privilegiada geograficamente, 200 metros acima do nível do mar, seria mais fácil organizar a defesa em caso de ataque e controlar entradas e saídas da marinha mercante. Esta foi a zona inicial de ocupação do território da cidade da Praia e contou com um plano de organização urbanística que ainda hoje se reflete nas ruas paralelas e perpendiculares, nas praças de convívio e nos edifícios mais nobres da cidade. Na ponta extrema, junto ao miradouro do descobridor Diogo Gomes, a quem se atribuiu durante anos a descoberta de Cabo Verde, está o Palácio Presidencial, uma construção colonial onde o governador de Cabo Verde vivia e dali controlava os negócios do mar. Hoje é o presidente da República de Cabo Verde que ali tem a sua morada.

Ali ao lado, na Praça Alexandre Albuquerque, está a câmara municipal, o Palácio da Cultura, a Igreja de Nossa Senhora da Graça, e ao centro do jardim construído posteriormente, uma esplanada moderninnha, a Morabeza. Este é um dos centros de convívio da cidade de Praia. Na confluência dos cultos – religioso ou musical – os cabo-verdianos encontram‑se aqui para conversar, assistir a demonstrações espontâneas de música, de capoeira e do que mais houver para mostrar. Vale a pena uma visita demorada ao Palácio da Cultura Ildo Lobo, cujo nome denuncia a vocação para a música. Ildo Lobo é dos mais célebres intérpretes de Cabo Verde. Desaparecido em 2004, deixou uma extensa obra musical da qual o disco Nós Morna, o primeiro álbum a solo, é uma homenagem à vivência de Cabo Verde. No centro cultural que lhe presta homenagem há concertos ao vivo quase todas as noites, um bar bem animado e neste é possível fazer refeições caseiras e saborosas. Nada como um guisado de búzios acompanhado por uma cerveja local Strela para ficar reconfortado a altas horas da noite.

A muralha fortificada da cidade da Praia é hoje um miradouro apreciado por locais e turistas..

Seguindo pelo nobre bairro do Plateau encontramos outros edifícios históricos, como a Escola Grande, a primeira escola pública da ilha, o Liceu, Quartel Jaime Mota, o Banco e diversas casas particulares com traça antiga, como aquela onde hoje se instala o Museu Etnográfico da Praia com um acervo de alfaias agrícolas significativo, e a outra onde funciona desde 2015 a Sala‑Museu Amílcar Cabral, um pequeno museu que conserva a memória histórica desta figura fundamental da independência de Cabo Verde. A visita é fundamental para conhecer o homem político, poeta, engenheiro, revolucionário, que deu o maior contributo teórico para as fundações do país. Na Sala‑Museu conservam‑se fotografias, livros, cartazes e outros documentos de e sobre este pai da nação cabo‑verdiana. Nas paredes externas está um belíssimo mural com um retrato e um poema de Cabral.

A vida da cidade da Praia, como de quase todas as cidades, sente‑se melhor no mercado. Situado na rua pedonal do centro da cidade, também no Plateau, não é preciso estar muito perto para ouvir o ruído animado das gentes que se encontram, dos carrinhos de mão a rodar. Conforme nos aproximamos vêm chegando os cheiros da fruta madura e do peixe fresco. As mulheres conversam na rua com os filhos às costas, há outras à espera na soleira das portas. «Câmbio, câmbio» dizem‑nos alguns homens na rua. «Não quero, obrigada» é quanto basta para que não nos falem mais de trocar moeda. Entramos no mercado por uma das quatro portas, uma para cada fachada.

Dentro da estrutura arejada sucedem‑se bancas de fruta e legumes lindos de ver, frescos, coloridos – há manga, zimbrão, tamarindo, jambre, marmelo, bananas de várias espécies, calabaceira, azedinha – e pimentos picantes, malaguetas de todos os feitios. «O piquinote é o mais forte», diz‑nos uma vendedora : «Um saco, duzentos escudos». Além da boa compra (a cerca de 1,80 euros) ainda recebemos uma breve lição de culinária: «É só fazer com whiskey e azeite num frasco.» Mais à frente há uma banca de farinhas e sêmolas de milho e de mandioca, há feijão e milho seco, seguem‑se as carnes salgadas. Há doces caseiros, mulheres que vendem comida de tacho.

Debaixo das escadas, um grupo de mulheres faz salsichas frescas. Estão vermelhas do colorau, cheirosas do alho e do picante. No andar de cima, há uma zona dedicada à beleza. As boticárias são mulheres da mesma família que se aprumam a explicar «estas sementes pões no banho e ficas mais bonita», «desta erva fazes chá e resolves dores de barriga», «isto é uma máscara para a cara, ficas mais bonita». Outra vez? Se calhar não não há remédio. Das ervas medicinais reconhecem‑se algumas: funcho, manjericão e muitas mais nunca vistas por nós, que vêm dos confins da ilha e são utilizadas pela medicina tradicional.

O atum é pescado à linha por pequenas embarcações a pouca distância da
costa de Santiago.

O peixe, que já vimos à venda na rua, aqui no mercado da Praia tem uma zona especial, mais abrigada do sol, com acesso a água corrente. As garoupas são vermelho-vivo e têm pintas, os lírios são enormes, as bicas brilham, os xarrocos assustam de tão grandes e espinhosos que são. «Compra, menina, compra», diz uma peixeira. «Não posso, não tenho onde o cozinhar», respondo. «Não tens um grelhador? Tens uma casa sem grelhador?». A peixeira ri‑se e depois num crioulo indecifrável fala com a companheira de banca e ri‑se mais. As vendedoras, como a maioria das clientes neste mercado, falam em crioulo entre si. Connosco depende, há quem se aproxime do português para comunicar, há quem prossiga em crioulo.

O crioulo é uma questão em aberto em Cabo Verde. Este país de língua oficial portuguesa tem nos seus planos a oficialização da língua doméstica da maioria dos cidadãos cabo-verdianos e o ministro da Cultura diz que quer elevar o estatuto do crioulo a língua oficial durante esta legislatura. «A minha estratégia como ministro é conseguir a oficialização do crioulo. Eu quero fazer parte da geração que oficializou o crioulo», dizia Abraão Vicente numa entrevista em novembro de 2017, à margem do Festival Literário Morabeza. Diz o ministro que não se trata de desvalorizar o português, até porque, segundo afirmava, «o lugar do português não está em causa. Cabo Verde adotou desde este ano letivo o português como língua segunda, que é um instrumento de trabalho para reforçar o português, porque estamos a notar que está a sair fragilizado pela predominância do crioulo no quotidiano. O que queremos como país e como Estado é reforçar o português. É o nosso principal instrumento de internacionalização e de integração no mundo. Não temos nenhuma dúvida disto.»

Nada que impeça a comunicação entre o viajante e o habitante local. Haja vontade para nos entendermos que conseguimos. Portugal é o segundo maior emissor de turistas para o país (o primeiro é o Reino Unido) e, muito mais importante, a história que une os dois países faz que os portugueses sejam bem‑vindos pela maioria da população. E depois há uma sensação de familiaridade que sentimos enquanto visitantes, qualquer coisa boa do passado que se encontra aqui e que já desapareceu em Portugal.

Sentados no terraço do pequeno hotel que nos acolhe, a comer um papo‑seco cozido a lenha e um iogurte caseiro para o pequeno‑almoço, a impressão é de estar num lugar conhecido. Há qualquer coisa aqui, que é lenta, confortável e alegre e que já não existe na Europa. É a noção de cidade pequena com uma vida agitada onde todos se conhecem e por isso se cumprimentam, nem que seja com um aceno de cabeça. Nem toda a história que Portugal partilha com Cabo Verde se faz de boas memórias.

 

A pouco mais de hora e meia de caminho (sinuoso) da cidade da Praia está a Colónia Penal do Tarrafal, que no início do Estado Novo, em 1936, foi instituída como lugar de desterro para prisioneiros políticos. Portugal tinha um regime autoritário que vigorava em todo império colonial e o Tarrafal funcionava como campo de concentração – e depois, a partir de 1954, campo de trabalho forçado. Os desterrados eram condenados por delitos
de opinião, de pensamento e revoltas políticas. Dos 152 presos políticos iniciais – marinheiros e operários que se tinham revoltado contra a ditadura de Salazar –, sete homens morreram no primeiro ano de prisão, tais eram as condições do lugar, que incluía tortura do sono, exposição sem descanso à luz solar, fome. Até 1948 estão registadas 32 mortes. A média de idades destes homens, todos oriundos de Portugal, à data da morte, é de menos de 40 anos. Os corpos só puderam ser recuperados pelas famílias a partir de 1974.

A ilha de Santiago é casa para mais de 260 mil pessoas. É a mais populosa do arquipélago

É em silêncio que se ouvem as explicações do guia. E é uma ferida que se abre quando lemos frases como a que está escrita na enfermaria: «Não estou aqui para curar mas sim para assinar certidões de óbito», atribuída ao médico da prisão do Tarrafal. A visita ao campo de concentração demora uma hora, passando por estruturas de tortura, alas dos prisioneiros em que as nacionalidades não se misturavam – ali a cela dos presos angolanos, aqui a dos guineenses – (talvez para que a resistência não se organizasse entre territórios), salas com objetos do quotidiano dos guardas, registos prisionais. A denominação do espaço hoje é Museu da Resistência do Tarrafal e quer constituir‑se como um espaço de educação para a democracia.

Fora dos muros da prisão há uma aldeia que se orgulha de ter uma das mais belas praias de Santiago, a que sai em todos os postais ilustrados. As árvores estão lá, é verdade, numa pequena parte do areal. Mas esta baía virada a nordeste e abrigada pelas montanhas não precisa de palmeiras para ser das mais bonitas da ilha de Santiago. A areia branca, o mar azul-clarinho e a temperatura da água a 25 graus em novembro dispensam ornamentações. E há sempre bónus: o peixe fresco na grelha a abrir o apetite, miúdos lindos a jogar à bola, uma música animada que faz querer dar um pezinho de dança. Não era preciso mais nada mas Santiago oferece muito mais do que é preciso.


Guia de viagem

Documentos: passaporte
Moeda: escudo cabo-verdiano – 1 euro equivale a 110$00
Fuso horário: GMT – 1
Idioma: português e badio (o crioulo de Santiago)

Ir
A TAP tem dois voos diretos Lisboa-Praia quase todos os dias. Ida e volta ronda os 450 euros por pessoa.

Quando ir
Todos os meses são bons: a temperatura varia pouco, embora os meses mais quentes sejam os de junho a outubro. Ao longo do ano raramente chove.

Ficar
BOUTIQUE HOTEL PRAIA MARIA
Este pequeno hotel não é luxuoso, mas tem um serviço irrepreensível e um pequeno‑almoço delicioso. Fica na rua mais central da cidade da Praia, mas nem por isso deixa de ser silencioso à noite. Não tem site, mas tem página no Facebook e está em algumas centrais de reservas online. Quarto duplo desde €58

PESTANA TRÓPICO
O hotel da cadeia portuguesa é um excelente 4 estrelas com todas as condições para uma estada confortável e uma situação privilegiada sobre o mar, na Praia. Quarto duplo desde €70
PESTANA.COM

HOTEL LIMEIRA
Na Cidade Velha, próximo do centro da cidade, tem quartos simples e apartamentos até à tipologia T3. Os hóspedes têm ao dispor uma piscina e um restaurante. Quarto duplo desde €27
HOTELLIMEIRA.CV

Comer
TERERU DE KULTURA
Peixe na grelha e pizas fazem o cardápio deste restaurante que se situa à beira‑mar, onde o chef Hélder Martins comanda a brigada. Cidade Velha.
Preço médio: €15

QUINTAL DA MÚSICA
Na cidade da Praia este espaço é uma montra da cultura gastronómica e musical de Cabo Verde. A lista inclui cachupa, arroz de peixe e muito mais.
Preço médio: €20

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