Como um destino à primeira vista improvável se tornou uma agradável surpresa. Relato em imagens e palavras de uma viagem que deixou marcas em quem a fez. À beira do golfo da Guiné, entre a Costa do Marfim, o Burkina Faso e o Togo, há um destino especial à espera de ser encontrado. Sem preconceitos.

Texto e fotografias de André Carvalho

Com tantos destinos para escolher em África, provavelmente poucas pessoas se lembrariam do Gana. Eu não me lembraria, mesmo sabendo que o primeiro contacto que este povo teve com europeus foi com o império português, mas quis o destino enviar-me para o Gana para fotografar uma viagem de surf.

Acra é uma típica cidade africana, caótica no trânsito, inacabada nas estradas, vendedores ambulantes nas filas, gritos e buzinadelas. Aterrei tarde e era quase meia-noite quando cheguei ao apartamento nos arredores da cidade. A fome apertava, não havia nada nas redondezas e pedi ao guia para nos levar a comer a algum sítio. Olhou para mim como quem diz «restaurantes para turistas estão fechados». Pedi-lhe para me levar onde ele iria àquela hora, sem medos. Arrancámos musseque adentro, por estradas de terra sem iluminação e tascas com gente a beber cerveja. Meia hora depois, sentado numa pedra, a comer uns noodles acabados de fazer por uma senhora numa espécie de barraca com rodas – e a beber uma cerveja fresca –, respirei fundo. «Era mesmo isto!» – foi uma das melhores refeições no Gana.

Como o nosso objetivo eram as ondas, saímos de Acra no dia seguinte, fizemos uma rápida visita às boas praias nos arredores da cidade. Há uma grande oferta hoteleira: resorts para todos os gostos, areal a perder de vista, palmeiras e água quente. O nosso destino era Bosua Beach, supostamente um dos destinos turísticos do país, mas já lá vamos.

Acra, Elmina, Bosua Beach, Dixcove, Cape 3 Points e Akynim foram os pontos de paragem desta viagem pela costa do Gana. Em busca de boas ondas e de grandes histórias.

Pelo caminho encontrámos simpáticas vilas piscatórias, com carências, mas muito pacíficas e com gente simpática e curiosa. Ser português é um bom cartão-de-visita, principalmente em Elmina. Além de ter um forte mandado construir por portugueses, a vila tem uma considerável quantidade de barcos de pesca por metro quadrado – a maior que já vi na vida.

Estrada acima e eis que, meia dúzia de horas mais tarde, chegamos ao nosso destino. Bosua Beach é uma pequena vila, mais propriamente uma rua. Tem dois resorts, um par de restaurantes e um ou outro bar para beber uma cerveja. É uma vila muito tranquila. A partir das 23h00 só se veem cabras e cães na rua e alguns turistas na praia à volta das fogueiras. Bom peixe e lagosta (a preços acessíveis) foram a ementa durante quase toda a estada, com os pés na areia e os olhos no mar.

Seguimos viagem para Dixcove, uma vila piscatória que fica a cerca de meia hora de Bosua. Não há praticamente nada lá, além de um miradouro num forte inglês, mas tem um ar cinematográfico que nos leva a outra realidade.

Cape 3 Points fica a hora e meia de Bosua, por estradas de terra vermelha. O caminho não é fácil mas, lá chegando, todos os saltos dados pelo caminho compensam. É conhecida como a «terra perto do nada», pois é a localidade mais perto de uma localização no mar com zero graus de latitude e de longitude. E a zero metros de altitude… A primeira visão que temos da praia é incrível. No meio da selva verde avista-se de repente uma enorme baía de água azul, um farol e vegetação densa ainda a largos quilómetros de distância.

Por lá existe um eco lodge com alguns bungalows e um restaurante. Redes espalhadas nas árvores fazem qualquer sesta parecer irreal e a distância até ao mar é de 100 metros. Se o objetivo é descansar aquele é o sítio.

Ouvimos também falar num sítio chamado Akynim. Fomos à procura e o resultado foi incrível. Paramos a carrinha para ver as ondas e num instante estamos rodeados por crianças entre os 4 e os 10 anos. Tocam-nos na pele e riem-se sem parar, uma alegria genuína e contagiante no seu estado mais puro.

A última noite em Acra foi ligeiramente diferente da primeira. Jantámos mais cedo, num restaurante italiano, e fomos a uma discoteca local. A faceta mais turística de Acra também tem o seu encanto. O Gana, como destino improvável, tem muito para oferecer, da comida às praias, passando pela simpatia do povo. É um país pacífico que, provavelmente, nunca vai estar muito na moda, mas vale bem a visita.


André Carvalho

Nasceu em Lisboa em 1976 e licenciou-se em Design Gráfico pelo IADE em 1999. Em 2003 a fotografia passou de hobby a part-time graças ao snowboard, começando a publicar as primeiras fotografias em 2004. Em 2006, ganhou o primeiro concurso de fotografia de neve e snowboard promovido pela Snowboard Portugal. Ainda nesse ano, juntamente com um amigo, fundou a GOMA, um ateliê de design gráfico multidisciplinar. Um ano mais tarde começou a colaborar regularmente com revistas de surf europeias. Com a GOMA, durante três anos, foi o responsável gráfico pela Vert Magazine, seguindo-se a revista SURF Portugal. Tem portfólios e fotografias publicados em vários meios de comunicação em Portugal. Em 2014, o Turismo de Portugal escolheu-o para documentar os passos do surfista de ondas grandes Garrett McNamara em Portugal. Em 2015, ganhou o prémio Ondas de Ouro, na categoria de Fotografia do Ano. Também em 2015 lançou o livro de fotografia Navegar É Preciso, que não é de surf mas que tem o surf sempre presente. André Carvalho é um apaixonado pela vida.
Saiba mais sobre o seu trabalho em andrecarvalhophoto.com.

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