Patrícia Tadeia: testemunho de uma das portuguesas retidas em São Tomé e Príncipe
[Imagem: Direitos Reservados]

O testemunho de Patrícia Tadeia, jornalista do Canal 11, que ficou retida em São Tomé e Príncipe à conta das medidas relacionadas com o Covid-19. E o que se vai sentindo por lá em relação aos estrangeiros.

Quantas vezes sonhamos com aqueles dias de férias numa ilha de praias de areia branca e água transparente? Duas semanas sem o stress da cidade, sem fazer contas à vida. O sonho chegara. Sem férias fora de Portugal desde 2017, parti rumo ao paraíso. Treze dias em São Tomé e Príncipe. Treze dias que chegaram tarde demais.

No Príncipe encontrei a densidade florestal. E gentes que só sabem receber com um sorriso. O cuidado da D. Lídia em preparar a mesa do almoço, a disponibilidade do Sr. Rito, a simpatia do Zezé, os sonhos do Daílton, a experiência da D. Rosa. Abrem-te a porta de casa como quem te abre o coração. Enchem-te a alma e fazem-te crer que, apesar de terem tão pouco, são mais felizes do que alguma vez serás. No Príncipe, aprendi a valorizar o que tenho e quem tenho.

De São Tomé trouxe os sorrisos dos miúdos da roça Água Izé, onde deixámos três malas de material escolar e equipamentos. E a roça Saudade, onde senti que pertencia. Do Sul, ficaram as praias perfeitas. E da cidade? Da cidade recordo a azáfama. E a vida já assombrada por um vírus que assolava o mundo.

Ao longo destes 13 dias, fui sentindo – e ouvindo – um receio crescente dos locais ao olhar para nós, «os brancos dos países com o vírus». A falta de informação e, acima de tudo, a escassez de bens essenciais põem em risco uma comunidade que, até agora, consegue viver com o que tem, numa ilha, em que existe apenas um ventilador. De São Tomé ficou a esperança de que evitem ao máximo a chegada do vírus.

De longe, fui vivendo o drama em Portugal. De longe, tentei estar perto dos meus. Até ao dia em que quis voltar e não consegui. A TAP cancelou sem aviso o meu voo. Corri para o aeroporto, para tentar embarcar no último que fariam no espaço de um mês. Supliquei aos tripulantes em terra. Supliquei ao comandante. De nada valeu. Regressei ao alojamento e aí começou a minha jornada.

Uma noite em que quase não dormi, em constantes contactos com Portugal, com a Teresa, o Pedro, o Luís, e o Carlos. A Marta, o Tiago, o Manuel, o Rui, o José e o António. E tantos outros. Aqueles que ficaram minutos ao telefone com as linhas de apoio. Aqueles que me enviavam mensagens de ânimo. Aqueles que de tudo fizeram para que eu não me sentisse sozinha. O meu voo ainda foi remarcado para dois dias depois. Até que foi novamente cancelado. E aí, o medo.

Como eu estavam outras dezenas de portugueses. Aproximámo-nos. Ajudámo-nos. Fomos à Embaixada. E procurámos soluções em outras companhias. Ninguém tinha respostas concretas. Informações contraditórias. A solução era comprar um voo noutra companhia: a STP. A que faria o último voo para Portugal. E foi isso que aconteceu.

De regresso a casa, a emoção quando o avião toca o solo; as lágrimas de sentir que acabou; o arrepio de ver a cidade vazia… Mas a imensa felicidade de saber que estou junto dos meus. E para os meus. Estou em casa.

PS: Não consegui acionar o seguro em viagem, a seguradora alegou «Pandemia». Fiz uma reclamação junto da TAP, ainda não recebi qualquer resposta. Ainda há portugueses em São Tomé a aguardar o regresso.

Imagem de destaque: Instagram/Direitos Reservados

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