O castelo faz parar curiosos desde a estrada que liga Évora a Estremoz. Mas a vila de Evoramonte com 400 habitantes não se resume à fortaleza. Há um novo alojamento local, visitas guiadas e produtos regionais, a minutos de um olival e de uma quinta de vinhos.

Texto de Marlene Rendeiro
Fotografia de Paulo Spranger/GI

Duas oliveiras destoam entre as mais de duzentas companheiras no monte da Oliveira Velha, a poucos quilómetros de Evoramonte. São anciãs bravas, com 2000 anos de vida, ali nascidas espontaneamente. Há setenta anos, o avô de João Miguel Rosado quis arrancá-las quando decidiu plantar o olival tradicional, alinhado com fileiras de trigo pelo meio. «Mas não havia máquinas para arrancar as raízes das rochas e assim foram poupadas», conta o professor de Matemática, de Évora, que há três anos decidiu pegar no antigo terreno do avô e fazer algo diferente com o olival.

«O meu avô vendia a azeitona a outras pessoas, mas neste momento a manutenção dava tanto trabalho que começámos a pensar em produzir. Diziam que estávamos a ser muito ambiciosos, só tínhamos 231 oliveiras de variedade galega.» Hoje vai na sua quarta colheita de azeite Amor É Cego, nome sugerido pela designer Rita Rivotti. Uma referência aos bonecos de Estremoz (Património Cultural Imaterial da Humanidade) e à determinação da família Rosado.

A produção aumentou entretanto com a compra de outro olival tradicional a dez quilómetros dali, mas mantém-se de pequena escala. João apanha a azeitona mais cedo do que o habitual para garantir a sua qualidade; recusa-se a utilizar químicos e retira o fruto com uma vara que não danifica os ramos da árvore. A azeitona segue depois para o lagar de um amigo, que lhe empresta o espaço uma vez por ano. Fica a conhecer-se tudo isto numa ida ao monte da Oliveira Velha, onde João organiza experiências de olivoturismo, como degustações de azeite e de petiscos regionais.

Os visitantes são quase sempre estrangeiros, muitos do Brasil e alguns da Nova Zelândia, de Singapura e da Coreia do Sul. «Acho que é importante educar as pessoas para a cultura do azeite», conclui João.

Uma fortaleza única

Dali em direção a Estremoz, toma-se a Nacional 18 e é impossível não reparar no castelo que surge a meio caminho. É a fortaleza de Evoramonte, uma peça única de arquitetura militar, comparada por muitos ao forte de Salses, em França. O trabalho é atribuído aos irmãos Arruda, conhecidos pelas suas intervenções na Torre de Belém, no Aqueduto de Évora e no Convento de Cristo. Apesar do aspeto de baluarte, não terá sido usado para fins militares. «Seria uma espécie de demonstração de poder da Casa de Bragança», conta Matilde Ruas, da Andar a Monte, uma empresa de passeios turísticos e visitas, que criou recentemente com a mãe, Helena.

Matilde é tradutora de formação e regressou há um par de meses à sua terra natal, depois de uma temporada a trabalhar fora do país. A informação sai-lhe naturalmente, no percurso a pé que faz pela vila. «Toda a história de Evoramonte envolve muita especulação. Há falta de documentos e de escavações», explica. «O que se sabe é que as cinco portas de entrada foram mandadas construir por D. Dinis e que em 1531 há um terramoto que destrói quase toda a vila.» Matilde sabe de cor os factos, mas também quase todas as lendas. Fala-se da pedra dos Mouros que morreram de amor, do pego do Sino que será um portal para outro mundo e do túnel secreto que poderá ligar a fortaleza à ermida de São Sebastião.

Um casal, ela escocesa e ele sul-africano, abriu o The Place depois de se apaixonar por Evoramonte.

Na visita, que dura cerca de hora e meia, entra-se na restaurada capela da Misericórdia, passa-se pela casa onde o tratado de paz foi assinado entre os exércitos de D. Miguel e de D. Pedro, e ainda pelas pedras da calçada, pintadas por Inocência Lopes e espalhadas por toda a vila. Inocência já pintou mais de cinquenta pedras da calçada, cada uma representando uma diferente casa alentejana. «É um projeto que comecei há poucos meses e chama-se Casas da Sensa. O objetivo é pintar cem pedras», conta a partir do Celeiro Comum, uma loja de artesanato e de produtos regionais que abriu há 14 anos na vila, «quando ainda não havia quase nada». É do seu ateliê que saem pequenas peças de decoração feitas à mão, como os presépios, mas por ali também se encontram bolachas, queijos, enchidos e mel para levar na bagagem.

A visita com Matilde só termina no escritório da Andar a Monte, na antiga Casa da Câmara. «Em breve vamos também organizar workshops de olaria e ter um alojamento local.» Quando se cumprir, será o segundo da pequena vila, a seguir ao The Place, que fica mesmo em frente. Um projeto de um casal vindo de Londres que se deixou encantar por um cantinho alentejano, em frente ao castelo de Evoramonte. Mitch Webber já está à porta, sorridente, com o seu kilt azul-forte, acompanhado da mulher, Vicky. Ela, escocesa, ele um publicitário sul-africano, conheceram-se na capital britânica há 18 anos; viveram num barco no Tamisa e viajaram pelo mundo antes de aterrar em Portugal, em 2013.

A calma alentejana convenceu-os e três meses depois estavam de volta à procura de um espaço para um bed & breakfast. «Nunca tínhamos ouvido falar de Evoramonte, mas quando entrámos aqui e vimos esta paisagem soubemos que era o sítio certo», conta Mitch, no terraço, onde em tempos funcionou um restaurante chamado Convenção.

Três anos e muitas burocracias depois, o The Place abriu neste verão, com três quartos e uma suite (com kitchenette). A decoração celebra os gostos da dupla, com muitos livros e revistas de gastronomia e viagens, móveis rústicos feitos em Évora, quadros e pósteres de Tintin. «Dizemos que este é o sítio perfeito para conhecer o Alentejo. Daqui pode sair-se para conhecer nove castelos de diferentes vilas, o cromeleque dos Almendres, o mercado de Estremoz, ao sábado, o mármore de Vila Viçosa, os tapetes de Arraiolos… Ou então ficar pela vila e assistir a uma sessão de observação de aves», vinca Mitch.

A moldava Natacha já ganhou vários prémios de cozinha no Alentejo. Pode saber-se porquê no restaurante O Emigrante.

No The Place, pode também petiscar-se durante todo o dia, até às 20h00. Mitch e Vicky preparam uma piza de massa caseira, hambúrgueres e tábuas de queijos, mas ainda não se atrevem nas especialidades alentejanas. Sorte que O Emigrante fica a dois minutos de carro, já fora das muralhas de Evoramonte. A cozinha alentejana é autêntica e o espaço pertence a uma família moldava, que chegou ao Alentejo faz vinte anos.

A história de superação é contada por Natacha, 62 anos, a matriarca da família, que aprendeu os segredos e os temperos com as cozinheiras do lar onde trabalhou durante anos. «Perguntava-lhes pelas receitas e fui aprendendo», conta Natacha. «Quando abrimos o restaurante, há seis anos, as velhotas vinham cá ver como estava a comida da mãe», ri-se a nora, Iana, falando da sogra. «Ela já ganhou vários prémios aqui no Alentejo», acrescenta, enquanto coloca na mesa umas sarmale – folhas de couve recheadas com arroz.

Os pratos moldavos não estão no menu, mas Natacha prepara-os a pedido e já ninguém os estranha ao lado dos enchidos, dos queijos alentejanos e de uma carne de cachaço de porco com migas que se desfaz só com um garfo. Vem acompanhada de batatas finas caseiras, fritas diariamente por Natacha, que se recusa a usar congelador. «Só uso produtos frescos, que compro aos agricultores», conta num dos habituais serões que se prolongam noite fora, n’O Emigrante, onde há comida a todas as horas. Afinal, um bom prato com boa conversa é língua universal.


Guia de Evoramonte

Dormir

The Place
RUA DE SANTA MARIA, 26
Quarto duplo a partir de 80 euros (pequeno-almoço incluído)
Tel.: 927603884
Web: EVORAMONTE.COM

Visitar

Andar a Monte
RUA DA CONVENÇÃO, 29
Tel.: 967916857
Web: FACEBOOK.COM/ANDAR.AMONTE.7
Marcação visitas: [email protected]
Preço: 15 euros

Castelo de Evoramonte
Coordenadas GPS: 38.771842, -7.715884
Tel.: 26 895 00 25
Das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 17h00.
Preço: 2 euros

Amor é Cego
MONTE DA OLIVEIRA VELHA, AZARUJA
Coordenadas GPS: 38.682805, -7.774475
Tel.: 960117714
Web: AZEITEAMORECEGO.PT
Preço: 9 euros (prova simples) 40 euros com almoço

Herdade dos Outeiros Altos
Tel.: 966250063
Coordenadas GPS: 38.808047, -7.613038
Web: HERDADEDOSOUTEIROSALTOS.PT
Preço: visitas, 10 euros. Degustação de vinhos e produtos regionais, 10 euros.

Comer

O Emigrante
PRAÇA DOS AVIADORES, 3
Tel.: 268950053
Das 09h00 às 12h00, cafetaria. Restaurante, das 12h00 às 02h00. Não encerra.
Preço médio: 17 euros

Comprar

Celeiro Comum
RUA DE SANTA MARIA, 11
Tel.: 966759534
Web: FACEBOOK.COM/CELEIROCOMUM

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