Quem diz 80 diz muitas mais pois, embora pequeno, o grão-ducado tem muito para descobrir. Paisagens diversificadas, castelos centenários, uma exposição verdadeiramente tocante e um parque que apela a caminhada, mesmo quando se e sedentário, são boas razões para o querer explorar. Além disso, os portugueses são muito bem-vindos.

Texto de Teresa Frederico
Fotografia de Turismo Luxemburgo

Uma viagem à descoberta do Luxemburgo? Mal se parte da capital está-se na Alemanha, na Bélgica ou em França. Bastante comum, esta ideia não é totalmente descabida dado que o país tem apenas 82 quilómetros de «comprimento» e 57 de «largura», mas a verdade é que, para o viajante, o tamanho não importa. Pelo contrário, poderá mesmo constituir um incentivo pois permite descobrir lugares bem distintos sem que isso implique grandes deslocações.

Este é um destino especial considerando que, na sua pequenez, acolhe quase o mundo todo: dos 590 mil habitantes praticamente metade são estrangeiros (e quase setenta por cento na capital), de mais de 170 nacionalidades.

Portugueses há-os por todo o lado já que constituem a maior comunidade residente, correspondendo a cerca de dezasseis por cento da população total, mas representam muito mais do que uma mera percentagem. Bem integrada, a comunidade e frequentemente elogiada pelo seu contributo para o país, acarinhada e até recebe apoio sempre que há competições futebolísticas, com os luxemburgueses a torcerem pela seleção ou equipas lusas. A simpatia estende-se aos turistas, proporcionando em geral uma receção tão afável que qualquer português se sentira bem-vindo – uma sensação que se repete nas Ardenas, Mosela e Pequena Suíça, as três (de seis) regiões visitadas neste périplo pelo grão-ducado.

A população do grão-ducado fica pouco abaixo das 600 mil pessoas. Cerca de dezasseis por cento destas são de origem portuguesa.

Pode parecer estranho mas Eislek significa Ardenas, a região norte do país, em luxemburguês, a língua local de origem germânica que associa termos do francês. Com dois parques naturais, Haute-Sure e Our, ambos a merecerem ser explorados com tempo, tem como principais áreas urbanas Clervaux e Vianden.

A primeira, a cerca de uma hora da capital, está aninhada num vale banhado pelo rio Clerve e é dominada pelo castelo que remonta ao século XII. Destruído durante a II Guerra Mundial, foi alvo de um restauro esmerado e hoje acolhe vários espaços museológicos, nomeadamente o dedicado a Batalha das Ardenas, última tentativa do Terceiro Reich para derrotar os aliados no inverno de 1944-45, além de uma exposição permanente verdadeiramente imperdoável.

Chama-se The Family of Man, está longe de ser uma novidade mas surpreende pela atualidade – e sobretudo pela sensibilidade, que tanto faz esboçar um sorriso como sentir um enorme murro no estômago. Trata-se de uma mostra com meio milhar de fotos a preto e branco de 273 autores, oriundos de 68 países, organizada pelo fotógrafo de origem luxemburguesa Edward Steichen para o Museum of Modern Art (MoMA) de Nova Iorque, onde foi diretor do departamento de fotografia. Inaugurou em 1955, viajou por 150 museus espalhados pelo mundo – Paris foi a escala mais próxima da Península Ibérica, então liderada por Salazar e Franco – e encontrou aqui morada definitiva em 1994, como era desejo do seu criador. Definida como um apelo ao humanismo, faz parte do Registo da Memória do Mundo da UNESCO.

Imagens de fotógrafos famosos como Robert Capa, Dmitri Kessel ou Henri Cartier-Bresson, e do próprio Steichen, surgem lado a lado com fotos de autores desconhecidos, retratando a guerra e a fome mas também o casamento, a gravidez, a dança e a alegria. Demonstram, de facto, como todos os homens pertencem a uma mesma família – tantas vezes disfuncional e cruel –, num percurso expositivo tão simples quanto tocante e que termina, propositadamente, com fotos de crianças, símbolos de renovação e de esperança num futuro melhor.

Dada a importância da mensagem, faria todo o sentido que The Family of Man voltasse a correr mundo e a ser de novo vista por milhões de pessoas. Não estando prevista essa possibilidade, é forte motivo para viajar ate as Ardenas.

O Le Clervaux Boutique & Design Hotel e o Sofitel Luxembourg Le Grand são duas propostas para se alojar no país.

Foi obviamente grande o impacto da exposição na pequena Clervaux, hoje com uma população a rondar cinco mil habitantes. Um novo atrativo turístico decorreria da sua presença: o projeto Cité de l’Image, com mostras temporárias de fotografia contemporânea ao ar livre, em espaços como a Praça do Mercado ou o Jardin du Bra’Haus II, na subida para o castelo. A abadia beneditina de Saint-Maurice, fundada em 1910, e outro lugar a conhecer – ou, quem sabe, para ficar uns dias já que conta com uma vintena de quartos destinados a quem queira fazer um retiro, espiritual ou por outro motivo. Isto independentemente das convicções religiosas pois todas são respeitadas. Na realidade acolhe apenas homens, existindo uma casa a curta distância disponível para grupos de jovens, neste caso mistos.

Envolta pelo verdejante parque de Our, Clervaux constitui também um ponto de partida para caminhadas e passeios de bicicleta. E ao entardecer, de regresso a vila, que se percebe como é possível estar muito longe de tudo mesmo no centro da Europa comunitária. Uma área pedonal concentra algumas lojas e hotéis, incluindo o cinco estrelas Le Clervaux Boutique & Design Hotel, elegante e confortável, com piscina e centro de bem-estar onde não falta uma sala de relaxamento com lareira, detalhe que faz toda a diferença em dias mais frescos. No restaurante Da Lonati os pratos tem sabor italiano e os mais notívagos podem sempre beber um copo no Cabana Bar, por vezes animado por bandas ou DJ.

Tirando isso, não se passa rigorosamente nada em Clervaux, o que faz dela um bom local para relaxar, namorar e apreciar a natureza envolvente. Ao amanhecer, os pássaros residentes começam a encarregar-se da banda sonora.

«Tout ce que nous voyons est superbe, les Ardennes sont un enchantement» (ou, em tradução livre, tudo o que vemos e soberbo, as Ardenas são um encanto), escreveu Victor Hugo a sua mulher Adele, corria o ano de 1862, quando Les Misérables (Os Miseráveis) foi publicado em cidades como Bruxelas e Paris. O escritor francês conheceu a região como turista e uns anos mais tarde viria a permanecer algum tempo com o estatuto de refugiado político, tal como se descobre na sua casa-museu em Vianden, cidadezinha medieval situada sobre a fronteira com a Alemanha e a apenas meia centena de quilómetros da capital luxemburguesa.

Vianden e as Ardenas serão hoje essencialmente diferentes das que Victor Hugo conheceu mas continuam cheias de charme. Uma viagem de telecadeira – daquelas presentes em qualquer destino de neve mas aqui a funcionar durante todo o ano – permite ascender confortavelmente aos 440 metros e daí contemplar quer a beleza da área urbana quer a da vasta paisagem envolvente.

A região de Mullerthal é conhecida por pequena Suíça e destaca-se pelos vales, montanhas e imensas possibilidades de passeios ao ar livre.

A descer todos os santos ajudam, portanto o regresso pode e deve ser feito a pé, num passeio por entre a vegetação viçosa, até ao castelo local. Edificado entre os séculos XI e XIV, tem uma história conturbada: antiga residência dos condes de Vianden, acabou por ser vendido a um comerciante que, por sua vez, foi vendendo tudo o que pudesse render dinheiro. Acabou em ruínas, situação que só viria a alterar-se quando passou para posse do Estado, em 1977, e começou a ser restaurado.

Para a recuperação terão contribuído as contrapartidas por servir de cenário a filmes como Sherlock Holmes, com Christopher Lee e Morgan Fairchild (1990); A Sombra do Vampiro, protagonizado por John Malkovich e Willem Dafoe (1999); ou O Cavaleiro e o Dragão, com Patrick Swayze (2004). Imagens das respetivas filmagens são mantidas numa das várias salas de exposições.

Hoje nada denuncia o triste passado do castelo, muito pelo contrario, com a visita a proporcionar uma interessante viagem no tempo, tal como o Festival Medieval que acontece todos os verões.

Continuando na direção da capital, a apenas uma vintena de quilómetros fica Grevenmacher, principal centro urbano da Mosela luxemburguesa. Tal como as áreas homónimas que se estendem pela Alemanha e pela Franca, banhadas pelo rio que lhes da o nome, também são aqui produzidos vinhos Pinot Blanc e Noir, Riesling e um agradabilíssimo Cremant.

A cidade conserva um centro antigo feito de ruas estreitas e vestígios de fortificações medievais mas são os eventos relacionados com o vinho que mais gente atraem, nomeadamente a Fête du Raisin et du Vin (ou da uva e do vinho) que tem lugar em setembro. Bancas de produtores dão a conhecer os seus melhores vinhos e bandas tocam músicas animadas que põem a população a dançar até ao primeiro momento alto da festa, a entronização da jovem rainha do vinho e das suas quatro damas de honor. Depois, sempre acompanhados por copos e petiscos, há desfiles, concertos e espetáculo de fogo-de-artifício.

Para o apreciar longe da confusão o restaurante Bistro-Quai, debruçado sobre o rio Mosela, e uma boa e saborosa opção. A ementa tem grelhados, destacando-se a mista de peixes bem frescos, carnes e mariscos, servida em doses generosas. No final, uma avantajada sobremesa inspirada num mil-folhas denuncia a nacionalidade do gerente.

O salário mínimo no Luxemburgo está à beira dos dois mil euros por mês.

Joaquim Oliveira e natural de Guimarães, vive aqui vai para 21 anos, há três conseguiu a exploração deste espaço, pertença da câmara municipal, e o negócio e um sucesso. Com ele trabalha Sérgio Vieira, do Geres, que confirma a simpatia pelos portugueses – na verdade, da população que tem ate 50 anos pois, a partir dessa faixa etária, não e raro encontrar alguma resistência, diz. Tirando isso, a integração e um facto e tem-se uma vida boa. Há um senão: já não se consegue poupar como noutros tempos, explica Sérgio, pois um salário de três mil euros desce para dois mil com os impostos e a renda de um T2 é de 1700 euros (em Grevenmacher, que na capital esse seria o preço de um T1). Por isso vai ficando no Luxemburgo pelos filhos, mas quando se reformar pretende regressar a Portugal.

É por esta designação que e conhecida a região de Mullerthal, ou Mellerdall em luxemburguês, numa alusão as montanhas, vales e florestas que a caraterizam, com o rio, cascatas e formações rochosas a conferirem beleza acrescida a paisagem.

Echternach, sua capital cultural e cidade mais antiga do país, constitui ponto de paragem obrigatória para conhecer o centro medieval e a abadia beneditina de Saint Willibrord, monge irlandês que aqui se estabeleceu no ano de 698 Faleceu em 739 e pouco depois o seu túmulo passava a ser visitado por peregrinos em busca de ajuda.

A veneração ao santo viria a dar origem a um evento tão especial que desde 2010 integra as listas do Património Imaterial da Humanidade da UNESCO. Trata se da Procissão Dançante, tem lugar na terça-feira de Pentecostes e atrai todos os anos cerca de treze mil peregrinos, dos quais mais de oito mil ≪dançarinos≫: em grupos de cinco pessoas, segurando lenços brancos, desfilam entre o centro e o templo executando uma coreografia ao estilo da polca.

A curta distância, Mullerthal, localidade que deu nome a toda a região, e conhecida pelos atrativos naturais, como a fotogénica cascata Schiessentümpel. Os mais ativos podem explorar a paisagem para além da queda de água, visível da estrada, e descobrir as impressionantes formações rochosas Piteschkummer, Geierslee e Huellee, entre outras de nomes igualmente difíceis de pronunciar. Ao todo há 112 quilómetros de caminhos, em trilhos de distâncias e dificuldades variáveis, e o melhor e que o equipamento necessário está disponível para empréstimo, gratuitamente, num ≪centro de testes≫ da responsabilidade da Best of Wandern, entidade que coopera com marcas, operadores turísticos e regiões de caminhada que se estendem também a Alemanha, Franca e Áustria.

A avaliar pela Schiessentumpel, o passeio é tentador, até para quem se rendeu ao sedentarismo. Ter equipamento a disposição ajuda e, mesmo ao lado, há um parque de campismo com pods (pequenas tendas feitas de madeira). E se, de repente, esta volta ao Luxemburgo em oitenta horas passasse a cem ou mais? Valeria a pena, de certeza.


Guia de viagem

Documentos: Cartão de Cidadão ou passaporte
Moeda: Euro
Fuso horário: GMT + 1 horas
Idioma: Luxemburgûes, francês e alemão, mas é muito fácil comunicar em inglês

Ir

O Luxemburgo fica a cerca de 2h40 de distância de Portugal com voos easyJet, Ryanair, ou TAP.

Passeios e visitas

É conveniente comprar o Luxembourg Card, que permite viajar gratuitamente nos transportes públicos e dá acesso a mais de sessenta museus e atrações turísticas de todo o país.

O individual custa €13 (um dia), €20 (dois dias) ou €28 (três dias) mas existe uma modalidade familiar, para duas a cinco pessoas, que sai mais em conta: respetivamente €28, €48 e €68.

Ficar

Sofitel Luxembourg Le Grand Ducal
Hotel de cinco estrelas com umas das melhores vistas sobre a capital, é uma boa alternativa para ficar alojado antes de partir à descoberta do país – ou até para regressar todas as noites dado que as distâncias a percorrer são curtas.
Rue du Laboratoire L 35, Luxemburgo
Tel. +352 24 87 71
Quarto duplo a partir de 156 euros
sofitel.com

Le Clervaux Boutique & Design Hotel
Pacotes de duas noites com uma refeição no restaurante Da Lonati e tratamentos a dois no spa custam desde 280 euros por pessoa.
Grand-rue 9, Clervaux
Tel. +352 92 11 051
Quarto duplo a partir de 160 euros
le-clervaux.com

Abadia de Saint-Maurice
Recebe hóspedes (apenas homens) interessados em fazer um retiro, espiritual ou não, sendo respeitadas as convicções religiosas de cada um. O valor do quarto pode variar caso a caso e consoante a duração.
Também acolhe grupos de jovens (mistos) numa casa a curta distância da abadia.
Clervaux
Tel. +352 92 10 27
Quartos individuais desde 30 euros por dia
abbaye-clervaux.lu/fr/hotellerie

Camping Cascade
Perto da cascata Schiessentümpel, é um parque de campismo com ambiente familiar. Possui ecopods, pequenas cabanas de madeira com capacidade para duas pessoas.
Rue des Moulins 3 A, Mullerthal
Tel. +352 621 27 30 43
Cabanas a partir de 40 euros por noite
campingcascade.lu

Comer

Restaurant du Château
Considerado um dos melhores restaurantes de Clervaux, oferece cozinha francesa autêntica e sempre confecionada com produtos do dia. Pratos principais desde 26 euros.
Montée du Château 4, Clervaux
Tel. +352 26 90 48 57
Menus a partir de 37 euros
rdcc.lu

Bistroquai
Dirigido por um português, fica à beira do rio Mosela e possui uma agradável esplanada.
Route du Vin 3, Grevenmacher
Tel. +352 26 27 90 73
Os pratos principais variam entre 15 e 30 euros
bistroquai.lu

Heringer Millen
A curta distância da cascata de Schiessentümpel, é um espaço muito agradável que serve comida deliciosa (incluindo óptimas saladas), confeciona com produtos regionais e da época pelo chef Lars Fiebig.
Rue des Moulins 1, Mullerthal
Tel. +352 26 78 47 17
Pratos principais entre 19€ e 30€
heringermillen.lu

Caminhadas

Best of Wandern Test Center
Rue du Moulin 1, Mullerthal
A loja que cede equipamento de caminhada fica no posto de turismo Heringer Millen, instalado num moinho do século XVII.
mullerthal-millen.lu

Procissão Dançante
Echternach
Tem lugar na terça-feira de Pentecostes, 22 de maio.
visitechternach.lu

Festival Medieval
Castelo de Vianden
Neste ano decorre de 28 de julho a 5 de agosto.
A entrada custa 8,5 euros por adulto
castle-vianden.lu

Festa da uva e do vinho
Grevenmacher
Acontece no início de setembro (a data exata ainda não foi divulgada).
cfg.events

Visitar

O Luxembourg Card dá acesso gratuito a muitos museus e atrações turísticas de todo o país, portanto convém verificar se os lugares que pretende visitar estão incluídos antes de pagar entradas.

Exposição The Family of Man
Castelo de Clervaux
A entrada custa 6 euros.
Todos os domingos, às 16h00, há visitas guiadas gratuitas.
steichencollections-cna.lu

Cité de L’Image
Vários espaços públicos, Clervaux
A calendarização das exposições está disponível no site. Gratuito. Visitas guiadas custam 5 euros por adulto. Reservas em [email protected] ou através do telefone +352 26 90 34 96.
clervauximage.lu
Maison Victor Hugo
Rue de la Gare 37, Vianden
A entrada custa 5 euros por adulto, sendo gratuita até aos 25 anos.
victor-hugo.lu

Castelo de Vianden
Montée du Château, Vianden
A entrada custa 7 euros por adulto e 2 euros por criança dos 6 aos 12 anos.
castle-vianden.lu

Museu da Abadia de Echternach
Parvis de la Basilique 11, Echternach
A entrada custa 3 euros por adulto e é gratuita até aos 21 anos.
web.cathol.lu

Consulte mais informações em visitluxembourg.com.


Agradecimentos:

A Volta ao Mundo viajou a convite do Office National du Tourisme de Luxembourg.

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