(Foto: Saeed Khan / AFP)

Em Togoru, as primeiras vítimas do aquecimento climático são mesmo os mortos: o oceano já devorou o cemitério da pequena aldeia piscatória da maior ilha das Fiji, que já prepara a relocalização.

O que resta do cemitério (Foto: Andrew Leeson / AFP)

Lavenia McGoon, de 70 anos, estava lá quando os túmulos ficaram submersos por ondas calmas, lentas. Desde então, teme o dia em que o mar lhe baterá à porta.

Por enquanto, acredita no alívio que lhe podem trazer os pneus empilhados sob os cocos, no passeio da marginal. Sabe que é apenas uma questão de tempo até as alterações climáticas e a subida do nível das águas a obrigarem a fazer as malas de vez. “Ninguém pode parar a água”.

Togoru é uma pequena localidade na costa sul da ilha de Viti Levu. Conhecida por ali como “Big Nana”, Lavenia vive nas margens do oceano há quase 60 anos, numa pequena casa de madeira sem eletricidade nem água corrente.

(Foto: Saeed Khan / AFP)

Lavenia olha na direção das ondas. “Tínhamos uma plantação ali.” Mas o continente desapareceu. “Em 20 ou 30 anos, perdemos quase 55 metros” de terra. E neles estão os mortos de Togoru.

Os cerca de 200 túmulos jazem agora sob o oceano. Os nomes foram apagados pelo mar. Os restos mortais da maioria dos mortos foi arrastada para longe dali, conta “Big Nana”. Mas ela resiste e recusa ir embora do seu cantinho de paraíso. Aos 70 anos, seria morrer.

James Dunn é o líder da aldeia. Vive numa das três casas que restam. A aldeia ia para lá dos mortos, conta ele à IPS News. “A casa onde nasci desapareceu.” A lápide do tetravô, vindo da Irlanda para construir a aldeia, também. A própria Togoru já desapareceu do Google Maps, apesar dos cinco muros anti-submersão construídos ao longo dos anos…

“O primeiro-ministro veio aqui visitar-nos. Disse-nos que tínhamos de despedir-nos da nossa aldeia. Afortunadamente, não está a abandonar-nos…”, Conta James Dunn.

(Foto: Andrew Leeson / AFP)

Cercado pelas águas do Pacífico, o arquipélago das Fiji prepara-se para o dia em que a vida nas aldeias costeiras será impossível. O desafio é colossal.

O governo estima que mais de 600 municípios terão de ser evacuados e que 42 aldeias já estão gravemente ameaçadas. Mais de 70% dos 900 mil fijianos vivem a menos de cinco quilómetros da orla.

Ora, segundo um estudo da universidade de Monash, na Austrália, as águas do Pacífico ocidental estão a subir duas a três vezes mais depressa do que a média. As pequenas nações próximas do nível do mar, como Kiribati, ou Tuvalu, podem tornar-se completamente inabitáveis no espaço de 30 anos.

(Foto: Andrew Leeson / AFP)

A sorte das Fiji é ter terras altas. A vila de Vunidogoloa, na ilha de Vanua Levu, já se mudou para um terreno mais alto em 2014. Foi uma das primeiras a deslocar-se devido à subida do nível do mar.

Já os 200 habitantes de Veivatuloa, a 40 quilómetros da capital, Suva, ainda estudam soluções possíveis para salvar o povoado de palafitas. O muro anti-submersão que protege o povoado ainda vai resistindo, mas os moradores pressionam regularmente o governo para o seu reforço.

Porque, explica o porta-voz provincial, Sairusi Qaranivalu, a deslocalização é uma ideia dolorosa quando os costumes e os antepassados estão ligados à terra. “Tirá-los das aldeias é como desligá-los dos deveres tradicionais que têm de cumprir. É como desconstruir a vida tradicional e a forma como se vive em comunidade.”

(Foto: Saeed Khan / AFP)

Apesar da subida da água, os pescadores têm de ir cada vez mais longe mar adentro para encontrar peixe. Leona Nairuwai, um ancião de Veivatuloa, recorda que lhe bastava caminhar uns 20 metros para pescar.

Agora, precisa de um barco para ir pelo menos uma milha para o largo. Isto quando cerca de metade da população rural das Fiji sobrevive da pesca, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação.

Mares mais quentes estão a afetar os ecossistemas costeiros enquanto o pescado mais valioso está a ser esgotado pela pesca internacional.

Abaitia Rosivulavula, guia local e pescador de subsistência, ganha a vida a vender o que pesca em restaurantes do Pacific Harbour, importante ponto turístico do arquipélago. E admite que o seu negócio minguou.

(Foto: Saeed Khan / AFP)

Segundo o Índice de Conservação da Pesca Natural Ameaçada, as Fiji ocupam a 12ª posição entre as nações com a pesca mais ameaçada pelas alterações climáticas (entre 143 países). Outras nações do Pacífico – Micronésia, Ilhas Salomão, Vanuatu e Tonga – estão entre as dez primeiras.

Como lamenta “Big Nana”, são os países pequenos como o dela que pagam o preço ambiental por aqueles que se recusam a reduzir as emissões. “Só pensam em ganhar dinheiro. Nunca pensam nos outros, naqueles que vão sofrer.” Como ela já sofre: os filhos e os netos já fugiram dali. Garante que só os aconselha a estudar e imigrar. “Porque a água haverá sempre de seguir o seu curso”.

(Foto: Saeed Khan / AFP)

Partilhar