Exuberante enclave hindu no maior país muçulmano do mundo, BALI é uma excentricidade sem paralelo no arquipélago indonésio. Mantém-se intacto o mistério desta ilha debruçada sobre o Índico, salpicada de templos, vulcões e arrozais, apesar dos mais de cinco milhões de turistas que a visitam anualmente. É um daqueles milagres que não vale a pena tentar explicar: mergulhemos nele sem reservas, enquanto dura.

Texto e fotografias de José Sérgio


Reportagem publicada originalmente na edição de outubro de 2019 da revista Volta ao Mundo, número 300.

A norte, o mar de Bali; a sul, o oceano Índico. A oeste, a ilha de Java, epicentro político, económico, cultural e demográfico do arquipélago indonésio; a leste, um pequeno mas exuberante enclave hindu no maior país muçulmano do planeta: quase seis mil quilómetros quadrados (o equivalente a sete ilhas da Madeira) de um esplendoroso emaranhado de praias, templos, vulcões e arrozais onde as mais dedicadas e delicadas práticas devocionais convivem tu cá, tu lá com o hedonismo desbragado de pelo menos cinco milhões de turistas (número já superior à população local) que ali aportam anualmente. Por agora, estamos a meio caminho entre um e outro mundo, entre a dominante cultura javanesa, um potentado milenar, e a total excentricidade que é a mais visitada das 17 508 ilhas da Indonésia – em pleno Estreito de Bali, a bordo de um ferry que nos transportará de Banyuwangi, uma das portas de saída do extremo oriental de Java, até Gilimanuk, primeira paragem, apenas técnica, em território balinês.

Para os locais, serão 45 minutos de sesta, um passatempo nacional. Para nós, serão 45 minutos de transição contemplativa, apenas interrompida pelos vendedores ambulantes de snacks, de água, de tudo. À chegada, já estamos noutro mundo. Igualmente vulcânico, mas incomparavelmente mais verde e mais febril – ou não estivéssemos nós a caminho de Kuta, a mais turística de todas as paragens deste imenso arquipélago – e, surpreendentemente, também mais familiar. Mal desembarcamos, um perfume no ar: reconheço-o ou não? O olhar treinado foca, ainda ao longe, uma flor branca e perfeita no chão, ainda sem muita certeza. Aproximo-me e confirma-se: é a flor do frangipani, que enquanto estiver em Bali verei por todo o lado em colares de boas-vindas e tabuleiros de oferendas hindus. É como se estivesse em casa – mas noutra varanda, do lado de lá do Índico, onde se respira o mesmo cheiro doce e floral de Moçambique.

À saída do ferry, espera-nos uma carrinha que rasgará a savana em direção a Kuta. Seis horas de viagem apenas com pequenas escalas para esticar as pernas (come-se on the road, para poupar tempo); seis horas em que, depois de deixarmos para trás a silhueta montanhosa e verdejante do Parque Nacional Bali Barat, a janela da carrinha nos parecerá um ecrã de cinema: enquanto rolamos, sucedem-se, em velocidade pouco menos do que vertiginosa, os néons de estabelecimentos de todas as espécies, os postes de alta tensão sempre assoberbados de fios e de cabos de telecomunicações, os cartazes publicitários vistosos, quase cacofónicos, as gigantescas estátuas de divindades hindus que zelam por cada rotunda, os carros e os autocarros em ziguezague, e pessoas, pessoas, pessoas, cada vez mais carros, autocarros e pessoas à medida que nos aproximamos de Denpasar, a frenética e sempre congestionada capital da ilha.

«Mesmo assim, pávida e poeirenta, ela me surgia como o único lugar do mundo. Meu coração, afinal, não tinha sido enterrado. Estava ali, sempre esteve ali, reflorindo no frangipani. Toquei a árvore, colhi a flor, aspirei o perfume. Depois divaguei na varanda, com o oceano a namorar-me o olhar. Lembrei as palavras do pangolim:

-Aqui é onde a terra se despe e o tempo se deita.»

Mia Couto, em A Varanda do Frangipani

Kuta será a nossa primeira escala – e o nosso primeiro e único contacto com a desvairada beach culture, tão noturna quanto diurna (ou talvez mais noturna do que diurna) que se apossou desta estância estrategicamente próxima do aeroporto, e portanto continuamente atestada de turistas ocidentais desejosos de ondas e de festas (os ataques terroristas de 2002 abalaram a indústria, mas não por muito tempo). As ruas, estreitas, aparecem-nos pejadas de bares, discotecas, restaurantes, hotéis, lojas e veraneantes, num frenesim desenfreado; da tranquila aldeia de pescadores que Kuta foi até ao início dos anos 1970, época em que começou a transfigurar-se numa meca para surfistas e hedonistas, já não há o mais ínfimo vestígio.

Também não será em Seminyak, uns quilómetros acima de Kuta na costa ocidental desta ponta sul em que a ilha se aperta como um funil, que se encontrará a misteriosa Bali que até hoje se rege, imperturbável, alheia a quase tudo, pelo calendário muito próprio dos rituais e das festividades hindus. Tão massificada quanto Kuta, Seminyak é no entanto uma estância mais refinada – o que se traduz em restaurantes mais caros e mais cuidados. Mas nem todo este invejável cordão balnear padece do sobredesenvolvimento que descaraterizou Kuta e Seminyak: um pouco mais acima ainda, Canggu possui já todo o aparato de um resort de praia para ocidentais criteriosos (os hotéis de charme mesmo em cima da praia, os bares perfeitos para o pôr do Sol, os restaurantes de comida orgânica, os cafés de autor com os melhores grãos de que a Indonésia bem se pode gabar, alguns produzidos não muito longe dali) sem as multidões e a construção desalmada das suas vizinhas.

Será no entanto para sul, exactamente na direção contrária, que teremos de andar para ir ao encontro do ponto mais paradisíaco desta metade da ilha – de preferência parando pelo caminho para um festim de peixe e marisco num dos inúmeros restaurantes de grelhados que acompanham o enorme areal em meia-lua da praia de Jimbaran. A extremidade sudoeste da península de Bukit, o canto mais meridional de Bali, é um verdadeiro pulmão verde debruçado sobre o Índico. E também é debruçando-se sobre o Índico, no topo de uma dramática falésia, que pelo menos desde o século XI se empoleira o Templo de Uluwatu, porventura o mais atmosférico dos incontáveis locais de culto hindus que polvilham a ilha.

Inspirados pelo espírito da ilha, ou pela vontade de se casarem num local paradisíaco, muitos estrangeiros procuram Bali para a cerimónia.

Antes de entrarmos, é-nos distribuído o sarongue, de uso obrigatório nos templos hindus – e ainda uma peça de uso comum nesta região asiática, tanto entre homens como entre mulheres. Nesta ponta de Bali, de frente para o mar, com as distrações e as preocupações do mundo deixadas bem para trás das costas, o céu parece ser de facto o limite. Mas eis que os guias nos chamam à realidade, advertindo-nos para termos cuidado com os pertences, pois durante toda a visita ao templo estaremos na companhia dos nossos amigos macacos, que, completamente à vontade no seu habitat natural, se divertem a roubar os mais distraídos e a fugir com o saque para as profundezas da floresta.

Quando o pôr do Sol finalmente se põe sobre o Índico, acende-se o fogo que ilumina uma das várias recriações do Ramayana com que é quase impossível não se cruzar quem atravessa a ilha (ou quem, na vizinha Java, passa pelo colossal complexo de templos de Prambanan). Aqui todos parecem conhecer na ponta da língua as peripécias deste épico hindu que configurou todo o folclore local, dando origem ao espantoso repertório de danças clássicas da tradição balinesa; para quem, como nós, chega de fora, o espetáculo de kecak que fecha, ao pôr do Sol, a passagem pelo Templo de Uluwatu, ainda que certamente formatado para turista ver, é o primeiro sinal de que a potência da cultura singular que aqui se forjou continua intacta, e de que talvez a massificação não tenha ainda extinguido de vez o mistério (e o fogo) desta ilha. É a isso que brindo com uma cerveja Bintang, antes de dar o dia por terminado.

O azul da água, o verde dos arrozais

Em 1512, quando os portugueses avistaram pela primeira vez esta ilha a que nenhuns ocidentais haviam ainda aportado, o hinduísmo era já uma longa história em Bali. Foi a caminho das Molucas, na primeira expedição ordenada pelo vice-rei da Índia Afonso de Albuquerque àquele arquipélago cobiçado pelas suas especiarias, que os navegadores António de Abreu e Francisco Serrão se cruzaram com a ilha – outro famoso tripulante dessa campanha, o piloto e cartógrafo Francisco Rodrigues, colocou-a então no seu mapa do Sudeste Asiático, hoje tido como o primeiro atlas do mundo moderno.

Se ali se tivessem demorado, os portugueses teriam encontrado um peculiar cruzamento de elementos culturais indianos e chineses e tradições animistas autóctones, puzzle sincrético que remontará ao primeiro século da era cristã. Mais tardia, a atual dominante hindu (de acordo com o censo de 2010, 83,5 por cento da população professa o hinduísmo e apenas 13,4 por cento dos balineses são muçulmanos) data da altura em que, varridas pelo islão, as comunidades indianizadas de Java migram para Bali, onde, longe dos centros de difusão religiosa mais canónicos, desenvolvem um hinduísmo absolutamente à parte.

A forma como esse hinduísmo conseguiu encaixar-se na Constituição da Indonésia – segundo a qual não há lugar no país para religiões politeístas – é em si mesma prova de inteligência e de graciosidade. Nesta ilha onde cada família tem o seu templo – e cada clã e cada aldeia também… –, a prática religiosa está muito para lá do alcance da legislação; encontramo-la profundamente entranhada num quotidiano regido por rituais constantes, antiquíssimos, insubstituíveis, uma azáfama diária que salta à vista à medida que, adentrando-nos por estradas que rasgam o que em tempos foi selva, hoje ladeadas por um palmeiral verde e denso ou por pequenos campos de cultivo, nos aproximamos do centro de Bali.

Espalhados por toda a ilha, os seus mais de dez mil templos e toda a complexa teia de rituais que ali se desenrolam diariamente parecem ser ainda mais exuberantes aqui, entre montanhas e campos de arroz primorosamente alagados. Até o complexo sistema de irrigação, radicalmente cooperativo e radicalmente ecológico, que os balineses andam a aperfeiçoar desde o século IX e a que em 2012 a UNESCO reconheceu o estatuto de paisagem cultural – o subak –, obedece à filosofia que está na base do singular hinduísmo aqui praticado, o Tri Hita Karana (à letra, «as três origens do bem-estar», a saber: harmonia com deus, harmonia entre as pessoas e harmonia com a natureza). Em Bali, um arrozal verdejante não é só um arrozal verdejante: é uma manifestação de que tudo está em ordem na relação entre o divino, o humano e o natural.

Em parte adotada das crenças animistas preexistentes, a ideia de que deus está presente em todas as coisas orienta práticas de respeito pelo ambiente com séculos de tradição em Bali. Em junho de 1860, quando o naturalista galês Alfred Russel Wallace por ali passou, ficou «ao mesmo tempo atónito e maravilhado» com o que viu à sua frente: «Nunca tinha contemplado uma região tão bela e tão bem cultivada fora da Europa (…). Casas e aldeias, assinaladas por núcleos densos de palmeiras, tamarindeiros e outras árvores de fruto, espalham-se em todas as direções; entre elas, estendem-se campos de arroz luxuriantes, irrigados por um elaborado sistema de rega que seria o orgulho das mais bem cultivadas partes da Europa», escreveu no seu tratado sobre o arquipélago malaio. «O sistema subak de práticas de cultivo democráticas e igualitárias permitiu aos balineses tornarem-se os mais prolíficos produtores de arroz do arquipélago apesar do desafio de sustentar uma população densa», ratificaria mais de 150 anos depois a UNESCO, na hora de declarar esta paisagem Património da Humanidade.

A filosofia de harmonia que sustenta o subak encontra a sua expressão mais visível nos vários templos de água com os quais, se estivermos atentos, tropeçaremos em Bali. Um dos mais importantes é o Taman Ayun. Construído em 1634 e renovado em 1937, encontramo-lo cercado e protegido por um enorme fosso; no pátio, inúmeros meru (as icónicas torres-santuário que caraterizam a arquitetura devocional hindu, jainista e budista) erguem-se em direção ao céu, rodeadas por piscinas pejadas de flores de lótus – as únicas que, nesta ilha de extraordinária fecundidade, podem rivalizar com as flores do frangipani.

Os mesmos princípios do Tri Hita Karana regem a arquitetura, fazendo de Bali uma ilha interdita a torres e arranha-céus. Nenhum edifício pode superar em altura os templos e as estátuas religiosas, explicar-nos-á uma das guias que nos acompanham. Justamente por haver dúvidas de que a regra pudesse já ter sido violada, foi construído em agosto de 2018, num ponto alto do sul da ilha, um novo parque cultural onde se ergue, a 120 metros de altura, uma das maiores estátuas do mundo – um gigantesco Vishnu montado no seu fiel Garuda, megalómano projeto encomendado pelo governo local ao escultor-estrela Nyoman Nuarta. Não chegámos sequer perto dele, nos dias que passámos em Bali, mas a sua impositiva silhueta era visível a dezenas de quilómetros de distância, sugerindo que aqueles que se bateram contra a sua construção, argumentando que o tamanho mastodôntico e a natureza comercial do projeto perturbariam o equilíbrio espiritual da ilha, talvez tivessem uma certa razão…

A caminho do centro

Por muito comercial que até o espiritual se tenha tornado em Bali (basta contar os inúmeros resorts prometendo retiros zen e a glória do nirvana em troca de um cartão de crédito com plafond avantajado), mesmo uma pequena imersão de poucos dias nesta ilha abre portas para uma outra dimensão, alheia às rotinas e aos protocolos do capitalismo global; uma espécie de universo paralelo de comunhão com a natureza que se manifesta nas oferendas laboriosamente confecionadas, do nascer até ao pôr do Sol, por mãos e braços de diferentes gerações, mãos e braços que têm o dom de compor pequenas obras de arte com folhas de bananeira, pétalas de flores, grãos de arroz, paus de incenso e pedaços de frutos tropicais. Onde quer que estejamos, todas as manhãs encontramos estas explosões de cor à entrada das casas, dos templos, das lojas, dos quartos; aos pés de estátuas de deuses hindus e nos beirais dos lagos e dos tanques onde as flores de lótus proliferam em desvairada multiplicação.

Mais do que um longínquo paradigma religioso, o animismo que aqui encontrou uma poderosa aliança com a matriz hindu serve aos balineses de guia para o dia-a-dia: os bons espíritos, acreditam, estão em toda a parte e devem ser continuamente homenageados. Mesmo quem está apenas de passagem se cruzará inevitavelmente com uma das incontáveis cerimónias religiosas que todos os dias se celebram em Bali, sinalizadas pelas procissões improvisadas de homens, mulheres e crianças vestidos a rigor, sempre com um cesto de oferendas nas mãos: celebrações deste ou daquele deus, rituais sazonais, casamentos… A caminho do centro da ilha, deparamo-nos com vários, literalmente acampados na berma da estrada, em tendas e avançados. Tradicionalmente arranjados entre famílias da mesma casta, começam hoje a escapar a essa superintendência – mas continua a ser necessário obter o sim dos pais antes de se poder oficializar o sim dos noivos.

As festas de casamento costumam durar e durar e durar, de acordo com as tradições de cada aldeia, calculadas a partir do complexo calendário balinês, o Pawukon, cujos ciclos anuais são de apenas 210 dias. Inspirados por esse espírito de celebração, ou apenas pela vontade de se casarem numa ilha paradisíaca, muitos estrangeiros procuram Bali para a cerimónia. E, claro, a indústria do turismo foi atrás: o Blue Point Bay Villas & Spa, em Uluwatu, por exemplo, faz grande gala da sua capela de casamentos, estrategicamente colocada entre a piscina infinita e o mar, e dos seus vários pacotes para noivos (com ou sem violinos, com ou sem flores artificiais).

Mas não nos desviemos: estávamos, e ainda estamos, a caminho do centro desta ilha que não chegaremos a atravessar de uma ponta à outra (escapar-nos-ão, nesta primeira visita, as metades norte e leste), desta vez em direção aos cafezais e aos arrozais que o solo vulcânico de Bali torna especialmente férteis. Também não nos deteremos em Ubud, a meca de outro tipo de turismo, aquele que vem à procura de se deixar assoberbar pelo vistoso património cultural e espiritual balinês, de aprofundar o conhecimento do corpo e da mente num dos inúmeros retiros de yoga/meditação/bem-estar espalhados em redor do congestionado centro da cidade, ou apenas para comer melhor e mais orgânico do que em qualquer outro ponto da Indonésia.

Fora da bolha de Ubud, mas ali bem perto, a vida continua como era há séculos nos arrozais. Mas não no de Tegalalang, onde todos os dias centenas de turistas param, fotografam e seguem caminho. É de facto irresistível, o verde luxuriante destes campos prodigiosamente escalonados em socalcos que, em certas alturas do ano, quando alagados, espelham as nuvens e o sol nos seus imprevisíveis trânsitos pelo céu. Organizados numa cooperativa, os camponeses que dali retiram o seu sustento, e cujo vaivém socalco acima, socalco abaixo, se cruza agora também com o dos forasteiros, já não vivem apenas dos proventos do arroz – a pequena ajuda monetária que cobram aos turistas é uma forma de assegurar a conservação de uma paisagem e de um modo de vida que de outra forma talvez já tivessem sido cilindrados pela turistificação, permitindo a convivência (às vezes caricata) entre os selfie sticks que os visitantes manejam com o habitual frenesim da cultura Instagram e os cestos empoleirados nos ombros dos locais que circulam tão serenamente quanto ainda lhes é possível pelos seus arrozais agora invadidos. É factual: os campos de arroz de Tegalalang são os mais fotogénicos da ilha, mas seguramente não os mais tranquilos nem os mais autênticos. Basta sair um pouco dos circuitos turísticos de pacote para, a uma meia hora de caminho do centro de Ubud ou até menos, se aterrar sem grande esforço em arrozais a perder de vista onde os turistas se contam pelos dedos de uma mão e os camponeses podem, enfim, dedicar-se aos seus cultivos em paz e sossego.

A estância de Kuta é sinónimo de beach culture: uma meca para surfistas, hedonistas, amantes de praia e da noite.

Também os afamados cafezais de Bali se tornaram uma atração turística – embora não tão concorrida quanto os arrozais, pelo menos por enquanto. Explorações como a Bali Pulina Plantation, em Gianyar (uma pequena localidade conhecida pelo seu animado mercado noturno), permitem a quem vem de fora familiarizar-se com a extraordinária biodiversidade da ilha e com as particularidades da cultura do café (isto antes de uma descida de rappel ou de um mergulho numa piscina infinita em plena floresta). Embora esta quinta ofereça hoje uma diversidade de experiências de natureza, o café continua a ser o centro da sua atividade, regida por princípios de respeito pelo ambiente; no restaurante, por exemplo, os pratos são servidos em cascas de coco e não há toalhas sobre a mesa, apenas folhas de bananeira. Mas é no final da refeição, depois de uma revigorante sopa confecionada com leite de coco, pepino fresco e cebola frita, e de um gelado guarnecido com morangos e uns deliciosos feijões-verdes inesperadamente doces, que chega a joia da coroa: o ritual de degustação de uma poderosa especialidade local, o tão mítico quanto exótico café luwak. De acordo com a tradição, o grão desta variedade de café é, depois de extraído, ingerido, digerido e defecado por pequenos mamíferos, as civetas-africanas (ou gatos-almiscarados); nesse processo, os grãos são sujeitos a uma espécie de fermentação natural, sob a ação das enzimas libertadas pela digestão, dando origem a um café especialmente aromático.

Os mais impressionáveis talvez não queiram aventurar-se na experiência de apreciar este que é um dos cafés mais caros do mundo – e que várias organizações de salvaguarda dos animais já denunciaram, atendendo à forma por vezes desumana como os pequenos mamíferos necessários para o seu fabrico são explorados e descartados em nome de um consumo de luxo.

Mas estamos muito perto do fim desta viagem, que se encerrará na região montanhosa de Bedugul, longe destes dilemas tão do nosso tempo. Encaixado num vertiginoso vale tropical salpicado de lagos, cascatas e fontes termais, resguardado do mundo pela vegetação densa e compacta da selva balinesa, o Saranam Resort & Spa é o sítio certo para processar e assimilar os exuberantes e por vezes contraditórios estímulos desta curta viagem – e para começar a pensar na próxima, em que, se os deuses quiserem, os vulcões e as outras praias, ainda secretas, desta ilha abençoada pelo Índico e pelo frangipani não deixarão de nos escapar.


Guia de viagem

Ir

Não há voos diretos entre Portugal e a Indonésia, mas a Emirates viaja de Lisboa para Jacarta, via Dubai, todos os dias com preços desde 823 euros por pessoa, ida e volta.

Documentos
Passaporte (viajantes de Portugal não necessitam de visto para estadas até 30 dias).

Moeda
Rupia indonésia (IDR)
1 EUR = 15.528,32 IDR

Fuso horário
GMT+7 horas

Idioma
Balinês

Dormir

Na praia
Por mais congestionado que esteja o hotspot de Kuta, esta antiga praia de pescadores continua a ser o lugar mais procurado de Bali. Para quem procura um luxo moderado, existe o Discovery Kartika Plaza Hotel, que se gaba de possuir a melhor localização na linha de praia. No mesmo segmento de topo, mas em Seminyak, está o Double Six Luxury Hotel, com a sua imensa piscina curvilínea frente ao Índico. Descendo até à ponta sul da ilha, o Blue Point Villas & Spa, estrategicamente empoleirado no topo de uma falésia, muito perto do Templo de Uluwatu, permite outro tipo de recolhimento, embora seja uma unidade muito procurada para casamentos e festas privadas. Com uma elegante vibração colonial e um muito apetecível clube de praia, o LV8 Resort Hotel está em linha com o ambiente mais relaxado e despretensioso de Canggu.

TEL.: +62 361751067
discoverykartikaplaza.com

TEL.: +62 361730466
doublesix.com

TEL.: +62 361769888
bluepointbayvillas.com

TEL.: + 62 3618948888
lv8bali.com

Na montanha
Ir a Bali e ficar apenas pela praia é um desperdício. O mistério desta ilha está mais intacto no coração da luxuriante floresta tropical que cobre boa parte do seu território. A Volta ao Mundo sugere dois paradeiros possíveis para se isolar de tudo sem prescindir dos mais exigentes padrões de conforto e da excelente (e exótica) gastronomia balinesa. Muito perto dos icónicos arrozais em socalcos de Tegalalang, e junto às margens do rio Ayung, que por aqui é considerado sagrado, o Ayung Resort Ubud é um belíssimo hotel ricamente decorado com madeiras locais, a que se juntam antiguidades e fascinantes objetos de arte colecionados pelos proprietários: um refúgio para descansar, ler e meditar, com uma tranquila piscina debruçada sobre a vegetação Mais volumoso e imponente, dominando uma encosta em socalcos na região de Bedugul, o Saranam Resort dispõe de 79 quartos espaçosos e dez villas privadas e promete relaxar, rejuvenescer e revitalizar os seus hóspedes, aos quais oferece serviços mais ocidentais como ginásio e campo de golfe mas também aulas de yoga e de cozinha e até ateliês de canang, as vistosas oferendas diárias tão características do quotidiano balinês.

TEL.: + 62 3619001333
ayungresortubud.com

TEL.: + 62 36821038
saranamresort.com

Comer

Bali é um dos melhores lugares da Indonésia para comer. Embora a oferta internacional tenda a sobrepor-se, em quantidade, à cozinha local, vale a pena o esforço de fazer algumas incursões ao exterior dos hotéis. A Volta ao Mundo recomenda cinco opções. A primeira, não muito longe das praias que lhe indicámos, é o Wana – Warung Cerana, um restaurante descontraído e muito bem implantado num jardim, com uma extensa carta em que se cruzam clássicos ocidentais e clássicos indonésios. Para uma experiência mais refinada, e já em Ubud, o Hujan Locale talvez seja imbatível: além da banda sonora perfeita e do cenário com vista para a fervilhante vida local, o menu está atestado de tentações como a barriga de porco confitada com fetos e coco em molho de cebolinho, o caranguejo crocante à moda de Padang ou o polvo de Sumatra com funcho, anis e folha de curcuma. Também em Ubud, o popularíssimo Ibu Oka é uma instituição – mas aqui só há um prato, babi guling, ou seja leitão assado (com um viciante molho picante!). Outra instituição local é o mercado noturno de Gianyar, onde se podem passar horas, entre idas e vindas às movimentadas bancas de comida, e sair com uma amostra completa da gastronomia balinesa. Finalmente, e porque está ali mesmo ao lado do aeroporto, recomendamos que se despeça de Bali num dos restaurantes da praia de Jimbaran, com os pés na areia e as mãos besuntadas de peixe e marisco grelhado.

TEL.: + 62 81237208679
https://www.facebook.com/WANA-Warung-Cenana

TEL.: + 62 81339720306
hujanlocale.com

TEL.: + 62 361976435
https://www.facebook.com/Warung-Babi-Guling-Ibu-Oka


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