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O regresso a Marbella é em forma de resort onde nada fica de fora. E com aposta na febre do padel.

O padel pode ser uma boa desculpa num resort inteiramente dedicado ao desporto (e ao ócio, já lá vamos). Porque o padel europeu nasceu ali. Ali é Marbella, a cidade-festa de Málaga, 70 quilómetros em frente a Marrocos se quisermos ver as coisas à distância (tem dias, vê-se mesmo). Alfonso of Hohenlohe-Langenburg é o culpado, em 1974 emprestou a ideia do amigo mexicano Enrique Corcuera, que misturara o squash ao conceito do ténis na sua própria casa, em Acapulco, e criara o “Paddle Corcuera”, em 1969.

Os tempos e a preguiça endireitaram a apelidação para padel, indiferentes à história (que até vem de mais longe, dos britânicos embarcadiços com falta de espaço para uma partida de ténis a bordo dos navios), e fizeram de Marbella uma das mecas do desporto.

O novo Club Med Magna Marbella não podia passar ao lado e tem no padel uma aposta associada à marca desportiva Babolat que congrega ali, naquele autêntico cruzeiro em terra, centenas de amantes da modalidade.

O padel pode efetivamente ser a desculpa para passar uns dias no complexo de 14 hectares a meia encosta da Sierra Blanca, a três quilómetros de uma praia quase desnecessária com tanta comodidades no resort. Mas não é a única.

Diríamos que a primeira justificação é mesmo o conceito Club Med, que congrega aficionados há 73 anos (de gerações diferentes, claro). É o tudo incluído elevado a uma ideia de comunidade.

Começou com uma colónia de campismo em Maiorca, em 1950, das mãos do belga Gérard Blitz, cujo mote está à entrada do Magna Marbella, a preparar quem chega. “O objetivo da vida é ser feliz. O lugar para ser feliz é aqui. O momento para ser feliz é agora!”

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Passando adiante a história do clube, que está em todo o lado, atentemos neste caso concreto de um edifício de volumetria datada. Começou por ser Club Med em 1975, foi depois Don Miguel até chegar 2004 e ser abandonado.

A marca francesa (de capitais chineses) aceitou recuperá-lo em formato de aluguer de longa duração ao grupo Magna Invest e abriu-o em maio de 2022 para gáudio dos indefetíveis. É o único Club Med em Espanha e partilha a Península Ibérica com a unidade da Balaia, no Algarve.

É grande mesmo, chega a ser chocante numa primeira abordagem. Soma 485 quartos (20 deles suites, 28 com qualidade deluxe, todos comunicantes, para servir famílias), umas quatro centenas de funcionários, quatro piscinas, incontáveis campos de todo o desporto com bola e, lá está, uma aposta assumida no padel.

São, claramente, os campos mais ocupados do complexo, que equivale a um quatro estrelas.

Dirão alguns, ‘ah mas é longe da praia’. Não faz mal. A praia de Marbella é, digamos, banal, a cidade vale pela festa e pelo luxo e isso é coisa que não falta ali dentro.

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Há festa no bar da piscina antes do almoço e do jantar e depois da atividade diária da noite. E há a discoteca. E há – lá está a coisa da comunidade – o dress code para cada noite, comunicado aos clientes a tempo de o trazerem na bagagem. Num deles, é certo, haverá o 45. Porque o Club Med fez 45 anos, um dia, e imprimiu t-shirts que se tornaram uma coqueluche feita moda (nada mais chique do que exibir um 45 das Caraíbas na Andaluzia, ou de Djerba nos Alpes).

Nesse dia, tudo veste o 45. Com alegria impulsionada pelos GO, os gentis organizadores que são os funcionários vindos de fora (os locais são GE, gentis empregados), sempre prontos a animar os GM, gentis membros, vulgo clientes. E o mais animado dos GO, em Marbella, é mesmo Pierre-Jean Montagne, o diretor do resort, cabeça de cartaz das festas.

A decoração é a Andaluzia, o verde-azeitona e o dourado azeite, o vermelho sevilhano e o colorido de Dali, o castanho equestre e o brilho da tourada (nem tudo é perfeito). E cada espaço tem a sua nota. Há dois restaurantes – buffet no Sueños e carta no Tierra Gourmet Lounge –, dois bares, um spa com a marca Cinq Mondes, um ginásio completo com aulas, caminhadas e corridas guiadas, um circuito de jogging de dois quilómetros dentro da propriedade, trapézios para aprender artes circenses, campos de petanca, golfe, ioga na piscina e, suprema delícia de pais cansado, o Miniclube para os mais pequenos, dos quatro meses aos dez anos, incluído na estadia a partir dos quatro anos e com profissionais de creche.

E ainda oferece zona de eventos com salas capazes de sentar 1200 congressistas, ou a possibilidade a não clientes de passar ali o dia e usufruir de absolutamente tudo por 85 euros.

Depois, há as excursões, porque também é preciso sair dali. E a mais requisitada é a Ronda.

A mão de Santa Teresa
E Ronda é a famosa vila que tem uma ponte irrepetível de 98 metros sobre uma garganta, El Tajo, criada pelos séculos e pelo rio Guadalevín, a separar a cidade do tempo dos mouros da cidade “nova”, datada do século XV. Erguida a 739 metros de altitude, Ronda fica a centenas de curvas de Marbella, uma média de oito por quilómetro, mas a viagem vale cada uma delas. Leva-nos entre vinhedos e pinhais e olivais por uma das mais belas estrada do Mundo até nos deixar entregue à história que sai por todos os poros da vila.

E se a praça de touros do século XVIII é a mais antiga de Espanha e merece a visita mesmo a quem se opõe às touradas, como nós, agoniados pelas marcas de sangue da última festa espalhados em círculo na arena, porque é a História de Espanha que ali está também, Ronda tem outra estória mais discreta que vale o desvio. E mistura Portugal, ou não estivéssemos nós em toda a parte deste Mundo.

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Ali existe um convento das Carmelitas Descalças, ordem fundada por Santa Teresa de Ávila, ou Santa Teresa de Jesus, descendente de cristãos-novos apanhados pela Inquisição. E foi nele que se reuniram as monjas refugiadas de Portugal depois da extinção das ordens, religiosas no século XIX e da implantação da República em 1910.

Com elas traziam a mais importante das relíquias da fundadora, a sua mão esquerda (sem o dedo mindinho, que ficou com o padre que descobriu o corpo incorrupto de Teresa na sua exumação, dez meses após a sua morte em 1582), que fora levada para Lisboa e entregue às carmelitas descalças do Convento de Santo Alberto.

A Guerra Civil Espanhola acabou por tirar de Ronda a relíquia, feita amuleto de quem lhe pôs a mão, o último dos quais o ditador Francisco Franco, que a guardava no quarto porque lhe traria sorte. Depois da morte do generalíssimo, a família devolveria a relíquia a Ronda. Está hoje na Igreja de la Merced, bastando pedir a chave para se poder vê-la (está num relicário de prata).

Mas, claro, Ronda é, sobretudo, a sua ponte. Ponte Nova, porque substituiu uma anterior que caiu com poucos anos de vida, foi pensada pelo arquiteto José Martín de Aldehuela, que dá nome ao miradouro de onde melhor se vê, ainda que a vista do pátio da Casa Museu Don Bosco não seja de desprezar.

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Desde 1793, é a imagem de marca da vila das “yemas” (um pastel), dos tomates coração-de-boi (“o presunto da terra”), das cinzas de Orson Welles (que desejava ali ter morrido), do “infalível” toureiro Pedro Romero pintado por Goya, da escola de toureiros e do seu doping de antanho, os “huevos de toro”, entenda quem quiser.

A Volta ao Mundo viajou a convite do Club Med

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